Thursday, November 29, 2007

Nadia e o Hugo

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Minha infância pode ser dividida em dois períodos - AL e DL, ou seja, Antes de aprender a Ler e Depois de aprender a Ler. Duas fases absolutamente distintas e até conflitantes entre si. No período AL, fui a encarnação da criança levada da breca. Era tão inquieta que, com pouco mais de um ano, tive de ter a cabeça costurada. Eu não parava quieta, e minha mãe não tirava do meio da sala a mesinha de centro, mármore frio e duro. Some A com B e você terá pontos na cachola.

Consta que o evento aconteceu na noite de um domingo de Páscoa, e que a turma do Pronto Socorro foi tão pouco hábil para me manter imóvel que teriam me amarrado com um lençol. Não, eu não fui atentida no DOI-CODI, embora fosse bem a época.

Joelhos ralados em profusão. Eram tão comuns que eu já nem chorava. Uma vez, fui com minhas tias e meus primos visitar a obra da casa da Serra da Cantareira. Crianças, montes de areia e de pedra, escorregão, outro joelho esfolado. Minha tia mais nova limpava a ferida e eu me esvazia em lágrimas. "Está doendo tanto assim?". Doía nada. Eu chorava de pensar na bronca. "Minha mãe vai me mataaaaaaaaaaaaar!"

Foi bem no final da fase AL que Nadia surgiu. Um fenômeno que me impressionou mais que Uri Geller, aquele que entortava garfos e facas com o poder da mente. Nadia Comaneci, uma romena de 14 anos, foi o nome da Olimpíada de Montreal, em 1976. Pela primeira vez na história, uma ginasta conquistara três notas dez em sua seqüência de exercícios. O placar eletrônico do ginásio nem tinha espaço suficiente para ostentar a média. Apareceu 1.0. Nadia Comaneci. Só se falava nela naqueles tempos.



Piruetas, saltos mortais, cambalhotas, estrelas. Naquela época não se falava em duplo mortal carpado, que até hoje não sei bem o que é. Sei que ficava fascinada vendo Nadia rodopiar no chão, em cima da trave, pendurada nas barras assimétricas. Nadia no jornal matutino, no telejornal vespertino, no Jornal Nacional, no Esporte Espetacular. Nadia, Nadia, Nadia. Acho que ela foi a primeira pessoa que eu não era e queria ser.

Uma tarde, no auge da obsessão por Nadia, sugeri a uma das minhas primas que fizéssemos igual à romena. "A gente coloca uns colchonetes no quarto, vamos?". Fomos. Colchonetes, piruetas estabanadas, saltos destrambelhados, cambalhotas para frente e para trás. Um detalhe nos escapou: tínhamos acabado de almoçar. Não veio Nadia, chamamos o Hugo. Corremos as duas para o banheiro e devolvemos a refeição. Não ganhamos medalha nenhuma, só bronca. Pobre Nadia, escrava do regime totalitário da cortina de ferro. E nós, dos pitos maternos.

9 comments:

Anonymous said...

hahahahahah, quer dizer então que você qeria ser Nadia? É tão curioso, eu sempre quis ser Elvis. Bem ao menos eu nunca ralei joelhos e/ou quebrei partes do corpo tentando requebrar como o Rei. Mas um dia tomei um esporro capital do avô de um amigo, porque dentro da igreja na qual ele era pastor vendo o microfone dando sopa eu chequei, chquei se estava ligado e estava. Então sem nem pestanejar eu mandei: Well, its one for the money, two for the show, three to get ready, now go cat go, but dont you step on my blue suede shoes...
Acho que nunca mais fui lá...hehehe.
Sabe aquele seu post sobre o Rubber Soul? Inspirou um que coloquei agorinha mesmo lá no blog. Me honrra com sua opinião?

Anonymous said...

Me desculpe Alessandra ,mas é impossivel não lembrar de algumas passagens ,essas mesinhas com uma pedra de marmore são inesqueciveis e o atendimento em Pronto Socorro por aqui ,era de lascar.
Nos anos 80 ,fui com a familia de meu futuro sogro a um clube de campo perto de minha cidade e na hora de tirar as coisas do carro não sei como minha futura mulher ao pegar um cobertor enfiou um anzol de pescaria no dedo bem rente com a unha,dava para ver certinho o formato do anzol.
Lá fomos nós correndo de volta para a cidade ,já era bem tarde ,chegando no Pronto Socorro um rapaz que estava atendendo perguntou o que aconteceu e eu disse:
-Ela enfiou o anzol no dedo.
O rapaz olhou com uma cara estranha para ela e foi falar com o médico.Quando ele voltou ,disse para ela ir embora e lavar com agua!
Na hora perdi a paciência e mostrando o dedo dela para ele perguntei se ele estava de brincadeira, e ele respondeu:
Nossa!!Me desculpe ,eu entendi que ela tinha enfiado o zoiu no dedo!

Jonny'O

Unknown said...

HEHEHEHE

Isso me lembrou o dia que sai rolando o morro da rua que eu moro. Tinha 6 ou 7 anos, minha mãe me buscou na escola e o bendito fusquinha deu defeito perto de casa, era só descer um morro e subir outro pequeno, como não queria esperar, fui a pé pra casa. Desci correndo o morro, bem no final tinha uma escadinha com 4 degraus, pensei que era 2 e deu no que deu. Pulei, pisei na quina do degrau e saí rolando o morro. Minha garrafinha de suco foi parar do outro lado da rua. Felizmente não quebrei nada, só fiquei ralado do pé à cabeça, era mercúrio pra todo lado do corpo.

Anonymous said...

Alessandra, já te achava uma gatinha, e acho mais ainda agora, sabendo que deve ter os seus 35. Quer casar?

Anonymous said...

Estou rindo até agora da história do anzol. E quanto a seu texto, Alessandra, não canso de repetir, adoro!

Alessandra Alves said...

ron: você rebolando feito elvis na igreja foi mais ou menos o que a whoopi goldberg fez em "mudança de hábito", né? que cena!

adorei seu post, comentei e recomendo!

jonny´o: você me fez começar a sexta-feira chorando de rir! a história do anzol foi a pérola do dia, ainda que sua noiva não tenha achado graça nenhuma, suponho...

diego: tombos são sempre memoráveis!

anônimo: ora, tome tento rapaz, se apresente pelo menos!

luiza: obrigada, querida! apareça sempre.

Celinho Boy said...

Eu também costumo dividir minha infância nestas duas partes. Sinceramente gostava mais da primeira. Tinha irmãos com quem brincar. não tinha que se preocupar em pagar contas, acordar cedo...
Então queria ser Nadia, hein? Mas pelo menos se tornou uma atleta, he, he. Parecia gostar de esporte desde criancinha. Isso sem falar em F1 e automobilismo. Ah, claro, de futebol. Vc deve ter sido uma criança feliz...
Mas cadê a "fotinha" de tua infância para ilustrar te post?
Beijos e abraços Alessandra

Alessandra Alves said...

celinho: uma hora dessas, vou escrever sobre a fase DL, que me abriu para um mundo novo e que, de fato, trouxe uma enorme modificação física para mim. vou procurar fotos da minha infância na casa da minha mãe e prometo colocar aqui, OK?

Anonymous said...

Maintenant tout est clair, je remercie de l'aide dans cette question. http://cgi3.ebay.fr/ws/eBayISAPI.dll?ViewUserPage&userid=cialis-achat&hc=1&key=cialis20mg achat cialis [url=http://cgi3.ebay.fr/ws/eBayISAPI.dll?ViewUserPage&userid=cialis-achat&hc=1&key=cialis20mg]cialis france[/url]