Monday, February 22, 2010

Casa Grande e Senzala



Nos primeiros tempos, o pai fechou os olhos para a luta fratricida. Um aventureiro lançou mão e, assim, a Williams de Nelson Piquet e Nigel Mansell perdeu o campeonato de 1986 para a McLaren de Alain Prost. No ano seguinte, engalfinhando-se como no anterior, os companheiros duelaram pelo título até o final. Mansell bateu cabeça, literalmente, e Piquet sagrou-se campeão de 1987, conquistando seu terceiro título mundial.

Mas 1987 foi um ano diferente na Fórmula 1. Um período de transição, marcado por um dos inúmeros contenciosos entre a Federação Internacional de Automobilismo (Esportivo, na época, já que as cartas eram dadas pela Fisa, de Jean-Marie Balestre) e as equipes. A queda de braço da vez eram os motores turbos, usados pelas grandes equipes. A Fisa, em vias de bani-los, achou uma maneira de compensar as equipes pequenas, que seguiam competindo com seus motores aspirados. Criou dois campeonatos paralelos - o Troféu Colin Chapman, para construtores, e a Copa Jim Clark, para pilotos.

E foi assim que Dr. Jonathan Palmer, médico formado que trocou o estetoscópio pelo volante, tornou-se campeão em 1987, com sua Tyrrell laureada entre os construtores. É claro que a compensação inventada pela Fisa não mudou a história. O melhor resultado de Palmer naquele ano foi um quarto lugar, na Austrália. Na zona de pontuação, só apareceu mais duas vezes - com dois quintos lugares (Alemanha e Mônaco). Nas outras treze corridas, praticamente só aparecia na imagem da TV levando bandeira azul para facilitar a passagem dos líderes.



Nunca imaginei que diria isso, mas o italiano Jarno Trulli soltou uma frase profética neste início de ano, com a qual concordo. A temporada de 2010 deve abrigar dois campeonatos paralelos. Não formalmente, como aconteceu em 1987, mas pela diferença entre as equipes grandes - especialmente Ferrari, McLaren, Red Bull e Mercedes - das últimas do pelotão. Em relação às últimas, ainda é difícil até imaginar quem estará no grid do Bahrein. A USF1 já pediu licença das quatro primeiras provas, a Campos ainda está passando o boné, a Virgin passou vergonha em Jerez. A Sauber se agarra ao espólio da BMW, a Stefan, se é que vem, vale-se do espólio da Toyota. E a Lotus de Trulli surge como o burguês sem berço que compra o título de nobreza para infiltrar-se no grand monde.

A FIA não vai criar um Troféu Puxadinho para essa turma sentir-se recompensada diante dos esnobes da Casa de Luxo. Mas é evidente que foi a entidade quem gerou, pariu e está nutrindo essas criaturas. Ao abrir as portas da casa para novas equipes, ainda nos tempos do polêmico e depois derrubado orçamento de 40 mil libras, a federação deixou que os pobres entrassem na festa, depois exigindo deles que se exibissem com pratarias e cristais que lhes faltam na dispensa. 2010 tem tudo para ser uma festa estranha, com gente esquisita.

Sunday, February 14, 2010

Quareeeeeeeeeeeeenta


Quem acompanha as transmissões de Fórmula 1 pelas rádios Bandeirantes e BandNews FM conhece o bordão. Quando faltam 40 voltas para o fim da prova, ou quando se completa a volta de número 40, o locutor Odinei Edson instiga o comentarista Fábio Seixas a dizer o número 40, e ele o faz com uma entonação bastante peculiar. "Quareeeeeeeeeeeeeeenta!". A origem, segundo Fábio, é uma rádio da Espanha, na qual o locutar apresenta "las quareeeeeeeeeenta" músicas mais pedidas.

Pois, na sexta-feira passada, completei meus primeiros quarenta anos. Foi um aniversário interessante, especialmente pelas reações díspares que colhi ao longo do dia. "Quarenta? Nossa, foi minha pior crise existencial...", escutei logo cedo. "Ah, quarenta anos... Que idade ótima para a mulher!".

Também escutei muito o indefectível "agora que entrou nos enta, você não sai mais". Para esses, uma resposta padrão: claro que saio, mas só daqui 60 anos, quando chegar aos cem.

Nesses últimos quarenta anos, por várias vezes fiz aniversário no Carnaval ou perto do Carnaval. Eram especialmente divertidos os aniversários passados na "casa da serra", verdadeira casa da sogra mantida por vários anos pela minha família materna. Ficava na Serra da Cantareira, em uma rua de terra, e tinha sido construída pelo meu avô. Só que ele morreu antes de concluída a fase de acabamento e a casa ficou para sempre com um ar inacabado, virando depositário dos móveis, louças e objetos decorativos que já ninguém queria em suas próprias casas.

Passar o Carnaval na casa da Serra era um programa lógico para a família. Chegava-se rapidamente ao local, no município de Mairiporã, de acesso fácil para quem morava na zona Norte de São Paulo. Ou seja, a família inteira. O programa das crianças era ficar na piscina o dia inteiro. O sol de fevereiro castigava a pele branca da maioria de nós. Levávamos bronca das mães, por abusarmos do sol, sofríamos com ombros, narizes e bochechas vermelhas, e nos dia seguinte, fazíamos tudo de novo.

À noite, sempre rolavam pizzas de massa Terra Branca, assadas em quantidade suficiente para sobrar e virar iguaria no café da manhã do dia seguinte. Jogávamos jogos de tabuleiro - Banco Imobiliário, Petrópolis - e também buraco e tranca. Quase sempre tinha briga por causa do jogo, e sempre, indefectivelmente, tinha um grupo animado vendo os desfiles das escolas do Rio. Jamais faltaram frases sobre ver a Mangueira entrar, claro.

Antes da fase "casa da serra", cheguei a pular Carnaval em algumas matinês do Acre Clube. Minha mãe e minhas tias se esmeravam na fantasias das meninas. Numa das vezes, fomos de Carmen Miranda. Em outra, levamos o prêmio de originalidade, todas vestidinhas de empregadas domésticas. Eu não gostava da barulheira nem do pula-pula, mas curtia muito ficar juntando montanhas de confete para jogar para cima. Quase sempre, eu saía do salão com crise de bronquite, por conta de tanto pó. Talvez venha daí meu inexistente entusiasmo por qualquer coisa que se assemelhe a Carnaval.

O gosto de ver os desfiles pela TV, tão cultivado pela turma na casa da serra, foi se esvaindo da minha vida. Mas algo ficou daqueles tempos. Não exatamente do Carnaval, mas do dia seguinte. Posso não ver nenhum desfile, mas adoro assistir as apurações. Se estiver apertada a disputa, ou se houver briga, melhor ainda!

Gosto cada vez menos de Carnaval, mas continuo adorando fazer aniversário. Obrigada a todos que ligaram, mandaram e-mails, torpedos, twitts etc. Vamos para mais quareeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeenta!

Wednesday, February 03, 2010

Treino é treino (?)


Torcedor de Fernando Alonso, ele me liga entusiasmado no começo da tarde, logo depois de chegar da escola e de checar os tempos de Valência.

- Holla, que tal?! As coisas estão ótimas para a Espanha, com Alonso em primeiro, De la Rosa em segundo e Alguersuari em quarto!

Easy, big fellow. Do outro lado da linha, arremessei certa dose de água fria no caliente palpite infantil. Parece não conhecer a máxima futebolística de que treino é treino, jogo é jogo. Digo a ele que muita coisa pode ter levado a esse domínio inexpugnável da Ferrari nos três dias. Pode haver simulacros de toda sorte, da equipe italiana e das outras. No entanto, o entusiasmo tiffoso tem, sim, razão de ser.

A primeira hipótese, sempre levantada pelos lá de trás: andaram com pouco combustível. Se foram a Valência para andar durante três dias com pouca gasolina, fecha a firma. Neste deserto de testes e boas ideias, gastar seis períodos de treino só para fazer figura é demonstração evidente de pouca inteligência. Ainda mais com o fim do reabastecimento e a necessidade de conhecer as reações do carro pesado, parcialmente abastecido e levinho, como nas classificações.

Não. Não acho que a Ferrari gastaria esse tempo só pelo status de estar na frente, ainda que de forma fantasiosa. A torcida apaixonada, que entupiu a via de acesso ao autódromo, poderia justificar um falso brilhante da Ferrari como presente de boas vindas a Alonso. Mas Massa fez quase igual na véspera e na antevéspera. Não é tudo blefe.

E ainda que eu queira baixar a bola da expectativa juvenil - coisa de mãe, para evitar eventuais futuras decepções - não deixo de lembrar da Brawn, em Barcelona, no ano passado. Chegou chegando e praticamente antecipou nos testes o que faria na Austrália, para valer.

Talvez siga nesa linha o raciocínio de Michael Schumacher, que já duvida de suas chances de vencer pela Mercedes logo no início da temporada. Pode ter percebido que a ex-Brawn não é tudo isso neste ano. O velho truque o difusor de dois andares já não é segredo e a equipe "alemã" pode estar mais próxima das outras do que esteve na primeira metade de 2009.

Para o bem da competitividade, eu torço mesmo para que Schumacher tenha um bom carro, competitivo e com potencial vencedor. Mas que não seja o melhor do grid. É muito melhor ver Schumacher em desvantagem, precisando caçar os adversários, como o fez na Malásia/1999 ou no Brasil/2006, do que tê-lo inquestionável lá na frente, quebrando recordes e construindo monotonias.

Que a Mercedes não seja uma Brawn em 2010!