Monday, August 31, 2009

Vingança



"(...)enquanto houver força em meu peito
Eu nao quero mais nada
Só vingança, vingança, vingança
Aos santos clamar (...)"

Os versos dor-de-cotovelo de Lupicínio Rodrigues parecem expressar o que há por trás da investigação da FIA em relação à Renault. Se Flavio Briatore mandou mesmo Nelsinho Piquet bater em Cingapura, para provocar a entrada de um safety car e assim favorecer Fernando Alonso, a casa pode cair para o chefe de equipe italiano. E fica bem evidente de onde poderia ter partido a denúncia - do desprezado Nelsinho.

"Atiraste uma pedra no peito de quem só te fez tanto bem
E quebraste um telhado, perdeste um abrigo
Feriste um amigo(...)"

A tática de Nelsinho, se for isso mesmo que se especula, soa pouco inteligente. Assumindo a farsa, Nelsinho também se assume como réu. Jogo de equipe doloso esse. Saindo da Renault, o piloto rasgou o verbo contra o antigo chefe. A letra de Herivelto Martins e David Nasser, em "Atiraste uma pedra", resume o sentimento da decepção que detona o revide.

"(...)Mas, se existe ainda
Quem queira me condenar,
Que venha logo
A primeira pedra
Me atirar."


O Trio de Ouro, formado por Nilo Chagas, Dalva de Oliveira e Herivelto Martins


Herivelto Martins, aliás, era casado com a cantora Dalva de Oliveira. Findo o caso de amor, vieram as brigas e os recados públicos, por meio das letras de música. Herivelto lançou "Atiraste uma pedra", e Dalva lançou mão de "Errei, sim", de Ataulfo Alves, remetendo à passagem bíblica, pela qual "quem não tiver pecado, que atire a primeira pedra". Nelsinho pode se valer dessa lógica, sabendo que, na Fórmula 1, como em qualquer esporte de alta competitividade, não há inocentes. Mais que isso: Nelsinho pode estar servindo a uma causa maior, orquestrada por outro ofendido - Max Mosley - que assim aniquilaria o segundo desafeto, após ter jogado para o ostracismo o inimigo Ron Dennis. De réu confesso, Nelsinho passaria a delator premiado.

"Seu mal é comentar o passado
Ninguém precisa saber
O que houve entre nós dois
O peixe é pro fundo das redes
Segredo é pra quatro paredes
Não deixe que males pequeninos
Venham transtornar os nossos destino (...)"

Dalva falava, Herivelto respondia. Dalva replicava, Herivelto treplicava. Briatore poderia apelar para a letra de "Segredo", de Herivelto e Marino Pinto, tentando convencer Nelsinho (leia-se Nelson Piquet, o pai) a deixar os acontecimentos de Cingapura no passado. Não o fez no tempo certo, agora parece tarde.

Será que a casa vai cair para Briatore?

Monday, August 24, 2009

Devagar, devagarinho



Oh, turba de homens ingênuos! Multidão de seres humanos desavisados! Vós que estais diante das câmeras de TV e não entendeis por que o jamaicano Usain Bolt parece sempre desleixado nos últimos metros de suas provas!

Olhai os passos débeis do magnífico atleta, depois para o cronômetro. Por que será que, depois de 60 ou 70 metros, no caso da prova dos 100 metros rasos, Bolt parece simplesmente se desinteressar da disputa? Por que ele perde centésimos de segundos preciosos olhando para os lados, mexendo a cabeça, gesticulando com os braços?

Ora, qualquer um que tenha informações mínimas sobre o esporte de alto nível sabe o quanto essas distrações fazem diferença no tempo final. Cheguei a escutar, de comentaristas gabaritados, falando em tom de brincadeira, que o ideal seria programar Bolt para uma prova de 200 metros e computar apenas os 100 primeiros, para que ele pudesse relaxar no final sem comprometer o resultado de fato medido.

Parece evidente que Bolt pode fazer muito melhor do que já fez, por mais assombroso que isso pareça. Então, perguntariam os ingênuos, por que ele não faz logo de uma vez?

Ah, é? Para quê?

Para bater os recordes mundiais dos 100 e dos 200 metros rasos apenas uma vez?

Bolt tem noção do quanto pode alcançar. Lembra o ucraniano Serguei Bubka, que subia o sarrafo de centímetro em centímetro, chegando a bater o recorde de salto com vara por 35 vezes. Tantas vezes quantas puder bater o recorde dos 100 metros, a prova mais nobre do atletismo, tanto mais rico e famoso Bolt ficará.

É por isso que ele desencana no final. Para não dar tudo numa única vez. Vai baixar esse recorde mais um monte de vezes. Sem pressa. Devagar, devagarinho.

Sunday, August 23, 2009

Brasil 100, Blog 400


Juro que não estava guardando o post de número 400 deste blog para a centésima vitória do Brasil, mas aconteceu.

A décima vitória na carreira de Rubens Barrichello foi o 100º triunfo do Brasil na Fórmula 1. E foi uma vitória merecida, em uma corrida chata, o GP da Europa, disputado em Valência, como no ano passado.

Uma vitória de estratégia, predicado tão bem exercido pelo chefe de equipe de Barrichello, Ross Brawn, o mesmo que ajudou a arquitetar suas outras nove vitórias, na Ferrari.

Algumas breves considerações sobre a corrida de Valência:

- a combinação pista travada + alta temperatura parece ter sido a fórmula mágica para a ascensão da McLaren nas duas últimas corridas. A conferir: as duas próximas provas, em Spa e Monza, manterão o time de Hamilton nas primeiras posições?

- o calor também parece forte aliado da Brawn. Terá a equipe mais dificuldades na Bélgica, com aquele tempinho habitualmente miserável das Ardenhas?

- mortinha da silva, em Valência, acho que a Red Bull volta a cantar de galo em Spa, por conta do traçado, que privilegia a velocidade. O duelo ali é um quebra-cabeça para chefe de equipe nenhum botar defeito. Webber à frente de Vettel, com quatro pontos e meio de vantagem. Dá para escolher um deles para lutar pelo título?

- ume menção honrosa ao improvável Timo Glock que, quietinho, quietinho, fez a melhor volta da corrida em Valência.

- o tom de Barrichello, na entrevista coletiva, me pareceu extra-emocionado, com agradecimentos a várias pessoas que o ajudaram na carreira. No ar, pelas rádios Bandeirantes/ Band News FM, eu disse que o tom me parecia de despedida. Sei lá, acho que Rubens está pensando em parar no final desta temporada.

- nas abreviaturas que usa para a transmissão de TV, a FIA identificou Luca Badoer como BAD. Bad como ruim, em inglês. Bad, mas bad mesmo. Pede pra sair, Luca!

Monday, August 17, 2009

Bote fé no velhinho

Pedro De La Rosa, Alexander Wurz, Jacques Villeneuve... Os nomes destes três ex-pilotos em atividade rondaram o noticiário nas últimas semanas, como prováveis ocupantes de assentos nas novas equipes da Fórmula 1. Por um momento, pensei que tinha voltado uns dez anos no tempo.



O espanhol De La Rosa, 38 anos, fez sua estreia em 1999.



Wurz, o austríaco de 35 anos, começou na categoria em 1997.



O campeão Villeneuve, canadense de 38 anos, debutou na Fórmula 1 em 1996.

A notícia da volta de Michael Schumacher era superlativa demais para se alinhar a esse espírito de baile da saudade, ainda que fosse o retorno de um piloto de 40 anos, que fez sua estreia em 1991.



Daí veio o forfait do alemão e foram buscar o italino Luca Badoer, mais um da safra de 1971 (38 anos, portanto), que fez sua estreia em 1993.

Como contemporânea dessa turma toda, não deixo de estar satisfeita com a valorização dos "velhinhos". E não deixo de pensar que estamos ouvindo falar de De La Rosa, Wurz, Villeneuve e Badoer em parte por suas habilidades ao volante. Entre eles, um campeão do mundo. Inquestionável. Mas também me parece óbvio que estes nomes ganharam relevância com a esdrúxula regra da proibição de testes.

Como promover jovens a titulares da Fórmula 1 sem lhes permitir ganhar quilometragem com os carros? Esta me parece a razão mais evidente para que os "velhinhos" estejam mais bem cotados que nomes como Niko Hulkenberg, Vitaly Petrov, Lucas di Grassi, Pastor Maldonado, Javier Villa, jovens estrelas da GP2 atual.

De La Rosa, Wurz, Villeneuve e Badoer são melhores que a atual geração da GP2? Não há como saber, pois os jovens não foram postos a prova e, se depender do regulamento atual da Fórmula 1, não o serão. Há três semanas, vimos o temor espalhado entre os próprios pilotos, diante da inexperiência do espanhol Jaime Alguersuari. Nesta semana, mais uma estreia provável, a do francês Romain Grosjean, verdinho como o outro. Entre os verdes e os velhinhos, as equipe podem apostar nos cabelos brancos contra a total inexperiência.



Na eleição presidencial de 1989, a primeira eleição direta para presidente do Brasil em 29 anos, o jingle do candidato Ulysses Guimarães entoava os seguintes versos: "Bote fé no velhinho, que o velhinho é demais/ Bote fé no velhinho, que ele sabe o que faz/ Vai mudar o Brasil, do Oiapoque ao Chuí/ E acabar com a molecagem que tem por aí". A principal plataforma do "Sr. Diretas", do deputado que promulgou a Constituição Cidadã de 1988 era, vejám só, a experiência contra a molecagem. Estaria a Fórmula 1 caminhando para se tornar uma categoria de velhinhos?

"E no curral Del Rey..."



Nos idos de 1986, 1987, eu tinha o hábito de escrever em minha Olivetti portátil enquanto escutava música. Sentava no chão, apoiava a máquina de escrever no degrau mais baixo da escada, bem ao lado do aparelho de som. Às vezes, dava uma esticada nas pernas e uma endireitada nas costas, enquanto olhava pela parede envidraçada, avistando dali a Serra da Cantareira, na zona norte de São Paulo. O hábito perdurou por bastante tempo, pelo menos até o começo de 1991, mas este período em especial (1986/1987) foi uma época em que ouvi muito Milton Nascimento e os demais artistas do Clube da Esquina.

Deve ter sido em "Clube da Esquina", a música, que ouvi falar pela primeira vez na Serra do Curral. Os versos dizem:

E no curral D'el Rey
Janelas se abram ao negro do mundo lunar
Mas eu não me acho perdido
No fundo da noite partiu minha voz
Já é hora do corpo vencer a manhã
Outro dia já vem e a vida se cansa na esquina
Fugindo, fugindo pra outro lugar

Milton, Minas e montanhas são uma tríade inseparável. Aliás, é óbvio falar de Minas e citar seus morros. Milton não foi o único. Drummond também usou e abusou das montanhas ao retratar sua Itabira. Enfim, cantar Minas e não louvar montanhas é como falar da Bahia sem citar o mar. De tanto ouvir Milton, olhando para a Serra da Cantareira, associei aquela minha paisagem doméstica à Serra do Curral.

Neste final de semana, fiquei cara a cara com a paisagem original, a de Minas. Há pouco mais de quatro meses, meu irmão e sua família se mudaram para Belo Horizonte. Eu não conhecia a capital mineira, mas não foi difícil identificar a Serra do Curral, assim que cheguei ao apartamento deles. Não que seja parecida com a "minha" Serra da Cantareira. Na verdade, não tem nada a ver. A "minha" montanha vai subindo suave, coberta de uma vegetação densa e escura. A montanha de Minas, do Milton e, agora, do meu irmão, é um paredão que parece estancar a cidade. Um morro acintosamente íngreme, com vegetação mais rala e muitos claros, provavelmente ocasionados pela seca sazonal.



Em apenas um final de semana, não se conhece uma cidade. Conheci as cercanias do bairro da Savassi, novo endereço do meu irmão, fui ao Parque das Mangabeiras, ao município de Nova Lima, ao Parque Ecológico, à Lagoa da Pampulha. De cara, meu grande respeito aos colegas corredores que treinam em BH. Êita cidade cheia de ladeira, sô! São os morros, os morros de Minas, do Milton, e agora do meu irmão. No Parque das Mangabeiras, uma surpresa e um flashback. Uma placa homenageando o músico Marco Antonio Araújo, morto aos 36 anos, em 1986, em consequência de um aneurisma cerebral. Como disse, eu ouvia muita música mineira na época, fiquei bem triste com a morte prematura, noticiada por meu querido Zuza Homem de Mello. Dedicaram a ele um teatro de arena no meio do parque. E o parque fica pertinho, pertinho da Serra do Curral. A foto que abre este post foi tirada de dentro do parque, mostrando uma das montanhas dessa cordilheira.

Acho que não estive em Santa Teresa, o bairro onde fica a tal esquina que originou o clube. Também não passei na Guajajaras, na Tamoios, na Tapuias, na Timbiras, na Tupis, aquelas ruas "todas no chão", que permeiam a letra de "Ruas da Cidade", do Lô Borges. Não passei nem em frente à sede do Cruzeiro, cujo salão recebeu vários bailes da vida daquele pessoal. Fica para a próxima. Quem sabe não volto lá, para correr a Volta da Pampulha, com seus aprazíveis 18 km?

Monday, August 03, 2009

Papai, eu quero



Achei que a demissão de Nelson Angelo Piquet não aconteceria ainda neste ano. O clima já era tão ruim há tanto tempo entre ele e o chefe, Flavio Briatore, que considerei indiferente a data da saída. Agora ou no final do ano parecia o menos importante. No entanto, saiu depois do GP da Hungria, vencido por uma cláusula que lhe obrigava a ter pelo menos 40% dos pontos do companheiro Fernando Alonso.

Nelsinho preferiu ele mesmo anunciar a demissão, antecipando-se ao anúncio da Renault. Aliás, essa lavada de honra - anunciar antes de ser demitido publicamente - também ficou parecendo cena orquestrada. Depois de muito discutir com Briatore, Piquet-pai deve ter batido o martelo pela última vez. "Tudo bem, ele sai, mas nós é que vamos divulgar." Ao que Briatore deve ter respondido com um grunhido de desprezo, erguendo-se da cadeira e movendo-se com aquele andar pastoso de quem empurra a protuberância abdominal sem pressa.

Depois do affair Alonso x Hamilton, nenhum piloto tem o direito de se iludir em obter condições iguais estando ao lado do espanhol. Alonso é um piloto extraordinário, dos poucos que fazem a diferença e conseguem eventualmente andar mais que o próprio carro. Mas é também egocêntrico e sabe exigir o melhor para si. Nelsinho e Nelsão deveriam saber. Claro, não era de se jogar fora uma oportunidade na Renault, mas não era de se esperar o mesmo tratamento dispensado a Alonso. E, mesmo com carros diferentes, parece indefensável uma sova de 27 a 1 pró-Alonso (considerando as 28 participações dos dois pilotos em treinos classificatórios nas temporadas de 2008 e 2009).

Há alguns dias, pelo Twitter, Nelsinho soltou o nome Piquet F1, acendendo no mundo afora a boataria em torno de uma equipe comandada por seu papy. O sério repórter Livio Oricchio, do Estadão, cravou que a equipe sai dos boatos para a vaga deixada pela BMW. O assessor de imprensa de Piquet pôs panos quentes e disse que não é bem assim. Eu sigo o faro do Livio, por vários motivos, a começar por sua já citada seriedade e longuíssima experiência na cobertura da categoria.

Observando um pouco mais de longe, vejo outros motivos que devem contribuir para Piquet associar-se ao clube dos donos de equipe. Certa vez, no aeroporto de Congonhas, Piquet-pai falou a um grupo de jornalistas, entre eles, esta veterana que vos escreve. Em dado momento da conversa, questionado sobre alguma decisão de Max Mosley, Nelsão interrompeu o repórter e disse: "O Mosley não manda nada. A Fórmula 1 é do Bernie", decretou. Bernie, seu ex-patrão na Brabham por sete temporadas, enfim percebeu que não pode confiar nas grandes montadoras, que vão progressivamente abandonando a categoria ao sabor dos números no vermelho que têm apresentado a seus acionistas.

Para manter a Fórmula 1, Bernie precisa de gente em que possa confiar. Gente do ramo, não CEOs de empresas globais que podem surfar com segurança em termos como shareholders e balanced scorecards, mas não sabem a diferença entre downforce e understeer. Precisa de gente como Piquet. O arranjo pelo qual o tricampeão entraria no negócio ainda parece nebuloso. Mas o fato de já ter gerenciado equipes de kart, Fórmula 3 e GP2, e de ser um legítimo garagista, que até dormia em garagem no começo da carreira, mais que o credencia para a tarefa.

À primeira vista, a solução caseira soa como mais uma tutela paterna a Nelsinho. As equipes criadas pelo pai, afinal, nada mais foram que instrumentos para o filho ter boas condições nas categorias que disputou. Vai reforçar a imagem de menino superprotegido, mas Nelsinho pode estar menos preocupado com isso do que eu. E Nelsão, afinal, pode até ganhar dinheiro na história. O capricho do filho, vai saber?, pode virar um bom negócio para o pai. A conferir.

Sunday, August 02, 2009

Benza Deus (nº 2)



Minha avó Elza deve ter sido a única pessoa na história da humanidade a se casar às seis horas da manhã. Ela e meu avô Antonio, naturalmente, posto que ela não se casou sozinha. Minha avó Elza tinha histórias curiosas, sui generis, algumas tristes, outras de chorar de rir.

Entre as tristes, a saga da mãe, portuguesa, que partiu de Trás-os-Montes com o marido e os três filhos e desembarcou no Brasil sozinha, vendo a família morrer aos poucos, dizimada por uma daquelas pragas que contaminavam os navios de imigrantes. Minha avó nasceu do segundo casamento, uma união que gerou vinte filhos, com um aproveitamento de menos de 50%. Sobraram nove. Minha avó era a terceira entre os vivos. Sui generis o detalhe de que o bisavô, o reprodutor dos vinte rebentos, era já viúvo, pai de doze filhos, alguns adultos, o que levou minha avó a vivenciar a estranha experiência de ter vários sobrinhos mais velhos que ela.

(Definitivamente, entendo porque ler "Cem Anos de Solidão" não me causou nenhuma estranheza...)

Vó Elza conheceu meu avô em fevereiro de 1940. Ele, de São Paulo, vendia aparelhos de rádio. Ela, em Amparo, interior paulista, bateu o olho no rapaz e, seguindo o conselho de uma prima mais velha, arrancou impulsivamente uma etiqueta do chapéu dele. Dizia, em uma dessas histórias curiosas, que isso era um código para a moça sinalizar ao galente pretendente que, sim, estava a fim. O impulso foi tanto que, ao arrancar a etiqueta, rasgou o forro do chapéu do moço da capital. O que não o impediu de voltar lá em junho do mesmo ano e trazê-la para São Paulo, como esposa.

Os costumes da época não permitiriam que a moça viesse para São Paulo sozinha com o noivo para se casar. E, naturalmente, não se aventava a possibilidade de transferir para a capital toda a família, com os doze filhos do primeiro casamento, os nove do segundo e adjacências. Tinha de ser em Amparo a cerimônia. A logística era complexa. Se casassem às seis da tarde, não teriam trem para seguir viagem. E não teriam morada para usufruir da noite de núpcias e seguir viagem na manhã seguinte. A solução foi marcar o casório para as seis da manhã. Finda a cerimônia bem a tempo de pegar o trem, em 29 de junho de 1940, Dia de São Pedro.

Pronto o vestido, Vó Elza cismou de entrar na igreja com um buquê de camélias brancas. Mas quem haveria de colher camélias antes das seis da manhã, para a cerimônia em tão inusitado horário? Pois a moça tinha pensado em tudo. Pediu que um dos irmãos (e não devia ser difícil achar algum dando sopa) colhesse algumas camélias na noite anterior. Deixou o buquê pronto e, terror! Quando foi se aprontar, viu que as flores estavam escuras. Vó Elza estava cansada de ver as belas flores vicejando na natureza, mas não conhecia a delicadeza da planta, que a um simples toque com a pele já começava a escurecer. A solução não me é exata na memória. Não sei quais flores escolhidas e colhidas para o evento, só sei que Vó Elza aparece na foto do casamento com uma maquiagem da moda, engraçadíssima aos dias de hoje, com a boca em coração, como a maquiagem da Minnie, e segurando um buquê de flores brancas, que não eram camélias.

Hoje, Vó Elza completaria 90 anos. Benza Deus, como ela diria. Segue uma camélia virtual para você, Vó Elza, Bisa Elza. Esta, tenho certeza, não vai escurecer.