Tuesday, March 28, 2006

A Banda x Disparada – o desempate



O II Festival da Música Brasileira completa 40 anos neste ano. Para quem não viveu ou já não lembra, um breve contexto, extraído do livro “A era dos festivais – Uma parábola”, do jornalista e crítico musical Zuza Homem de Mello. O festival realizado pela TV Record, em 1966, entrou para a história ao consagrar duas músicas no primeiro lugar: A Banda, de Chico Buarque, cantada por Nara Leão, e Disparada, de Geraldo Vandré e Théo de Barros, defendida por Jair Rodrigues.

A disputa entre as duas músicas foi acirrada a ponto de dividir a platéia, a audiência e de virar tema de comentário em todo o canto da cidade de São Paulo. As eliminatórias do festival começaram em setembro de 1966. Disparada classificou-se na primeira eliminatória. A Banda, na segunda. No dia da grande final, realizada no Teatro Record, na rua da Consolação, cinemas e teatros chegaram a cancelar sessões de suas atrações, tamanho o alvoroço causado pelo festival.

O resultado anunciado pelo apresentador Randal Juliano sacramentou o empate entre as duas músicas no primeiro lugar. O que a maioria das pessoas nunca soube, até 2003, é que o empate não aconteceu de fato. Os jurados reunidos deram vitória para A Banda, mas uma seqüência de decisões mudou o rumo da história.

Primeiro, Chico Buarque deixou claro, nos bastidores, que não aceitaria o prêmio, porque considerava Disparada melhor que sua música. Ao saber disso, um dos diretores e herdeiros da Record, Paulinho Machado de Carvalho, foi até a sala dos jurados e falou sobre a decisão de Chico. Influenciou o grupo a optar pelo empate, ponderando que seria a única forma de não deixar metade da platéia, e da audiência, frustrada. Comunicou o acerto a Chico, que aceitou dividir o prêmio, mas os outros compositores e demais participantes foram informados de que teria havido empate entre os jurados – seis votos para cada música.

A verdadeira história só veio a público quando Zuza lançou seu livro. Além de revelar a real escolha dos jurados, Zuza conta os bastidores da votação, mostrando como a divisão de torcida pelas duas músicas chegou inclusive a contagiar o júri. Houve quem tivesse votado na música de Chico, mas que depois dizia preferir Disparada.

A proposta, agora, é: 40 anos depois, vamos brincar de jurados e desempatar esse primeiro lugar? Entre A Banda e Disparada, para quem vai seu voto?

Como boa anfitriã, deixo meus comensais se servirem primeiro, depois dou minha opinião, mas prometo ir contando historinhas saborosas sobre o II Festival da Record aí embaixo, nos comentários. Para quem não conhece as músicas ou quer relembrá-las, é só clicar nos links abaixo.

Zuza, obrigada!

www.letradelta.com.br/disparada.mp3

www.letradelta.com.br/abanda.mp3



Monday, March 20, 2006

Assino embaixo

A coluna "Politicamente Responsáveis", escrita pela cantora, compositora, colunista GLS e proto-escritora Vange Leonel é um primor de coerência e concisão sobre o tema e, sem tirar nem pôr, representa também a minha opinião.

O original foi publicado na edição do dia 12 de março, na Revista da Folha, e a íntegra pode ser lida nesse link abaixo:

http://vangeleonel.blogspot.com/

Vamos ao debate?

Monday, March 13, 2006

Reminiscências 1 – Chicletes

Estudei dos 4 aos 17 anos em um colégio de freiras. Muito do que sou devo a essa formação – para o bem e para o mal, como tudo na vida. Poucos antes de começarem as aulas na 1ª série, fui acometida por um medo paralisante, o de ficar na classe de uma tal professora que era temida como a mais brava da escola.

Eu não ligava o nome à pessoa certa e, em meus pesadelos, ela surgia com a fisionomia de uma outra professora, que eu via circular pelos corredores e pátios do imenso colégio. Escapei ilesa na primeira série: não “caí” com a tal megera. Dois anos depois, em 1979, no entanto, aquela que eu imaginava ser a bruxa da 1ª série, na verdade professora da 3ª, veio a ser a minha mestra.

A confusão de fisionomias, vista em retrospectiva, evidencia para mim o quanto a aparência física revela da personalidade. Aquela que eu imaginava ser a bruxa da 1ª série tinha um porte ereto, rosto comprido e sisudo, cabelos invariavelmente repartidos ao meio e presos com uma fivela em um rabo-de-cavalo baixo. Tinha cara de brava, ponto. Pois quando aportei em sua classe, na 3ª série, ela confirmou todas as minhas expectativas.

Como é vivente, subtraio seu nome verdadeiro. No primeiro dia de aula, acomodadas todas as alunas (sim, só mulheres) em suas respectivas carteiras, ela proferiu a seguinte regra. “Meu nome é Fulana de Tal. Não sou irmã nem da mãe nem do pai de nenhuma de vocês. Portanto, não sou tia de ninguém aqui. Vocês podem me chamar de Fulana ou de dona Fulana, nunca de Tia Fulana.” Uau, que começo!

Era um mini-quartel a classe da Dona Fulana (é claro que nunca ninguém ousou chamá-la sem o dona na frente). Não se pedia para ir ao banheiro. No fundo da classe, ao lado da porta, uma plaquinha dupla-face pendurada em um barbante. De um lado, apenas um papel cartão verde. Do outro, um papel cartão rosa, com um ponto de interrogação. Sinal verde, banheiro liberado. A aluna saía, virava a plaquinha. A próxima só poderia sair quando a anterior voltasse. E desvirasse a placa.

Uma das regras da Dona Fulana, válida para toda a escola, desconfio, era a de não poder mascar chicletes durante a aula. A massa ignara de meninas de nove anos, logicamente, assentiu. Mas o ano foi passando, a acomodação aumentando, até que uma incauta resolveu adentrar a fortaleza mascando um chiclete. Deve ter esquecido, não tinha vocação suicida de rebelde, a coitada. Dona Fulana notou a displicência ruminante da menina e a chamou lá na frente. Mandou-a subir no estrado, aquele lugar que separava a autoridade suprema das perigosas meliantes de saias azul-marinho pregueadas.

“Sicrana, você está mascando chicletes?”. Sicrana engoliu em seco, não o chiclete. “Sim, professora.” “Sicrana, tire seu sapato.” Atônita, a menina ensaiou um balbuciante “mas, prof...”. “Tire seu sapato, eu já falei.” A menina descalçou um dos pés. “Agora, tire seu chiclete da boca, coloque dentro do seu sapato e calce-o novamente.” Diante do espanto da mascadora infratora, Dona Fulana repetiu a ordem. Sicrana ainda tentou argumentar. “Mas, professora, o chiclete vai grudar na minha meia!” Ao que Dona Fulana concluiu, regozijando-se visivelmente: “Exatamente, Sicrana. Porque se eu apenas tivesse chamado sua atenção e mandado um bilhete para sua mãe, dizendo que você estava mascando chiclete na sala de aula, ela poderia achar que eu tinha inventado. Assim, ela vai ter certeza.” E mandou a menina de volta para sua carteira.

Esse exercício de autoritarismo, baseado em humilhação pública, nunca me saiu da cabeça.

Corta a cena.

2006. Conversando com minha prima Camila, artista plástica formada pela FAAP e monitora da Pinacoteca do Estado de São Paulo, ela me relatava as agruras de acompanhar grupos de estudantes pelo museu. Um lugar de simplicidade espartana – paredes e quadros, basicamente – mas altamente suscetível a atos de vandalismo. Entre as regras da instituição, tchan-tchan-tchan-tchan!, não se pode mascar chicletes no local. Claro! Algum engraçadinho pode resolver grudar sua goma de mascar em um Almeida Junior ou num Tarsila do Amaral. Ou, sejamos otimistas, o chicle pode virar aquela coisa sem gosto e desagradável ao longo do percurso. Jogar onde?

Camila adverte a todos os grupos, antes de começar a visita. Nada de chicletes. Cansou de reforçar a regra a incautos, durante o percurso. Um deles até estourou uma bola enquanto ela dava as explicações sobre as obras. Certo dia, o insólito se instalou. Junto a um grupo de estudantes, mascava chicle, candidamente, uma professora! Camila foi sutil e lhe pediu que se livrasse daquilo. Veio uma desculpa inverossímil – algo como hipoglicemia ou gastrite justificando a mascação.

Entre a humilhação de Dona Fulana e a displicência da atual professorinha, onde nos perdemos? Será que a mestra atual foi aluna de Dona Fulana? Perdemos as rédeas do bom senso?

Wednesday, March 08, 2006

Mulheres na pista

O simpático site F1 na Veia fez um especial sobre o Dia Internacional da Mulher. O jornalista Alexandre Almeida Galvão me entrevistou e o resultado pode ser conferido aqui:

http://www.f1naveia.com/2006/noticias/noticia.php?cod=004393

Valeu, Alexandre, ficou bem legal!

Tuesday, March 07, 2006

As sete porcarias da corrida a pé

Muito já se falou sobre as sete maravilhas da corrida a pé. Como entusiasta deste que é o mais simples e democrático dos esportes, concordo com todas elas. Sinto-me tão bem correndo, depois de correr e com a perspectiva de correr que, desconfio, o número deve ser bem maior que sete. E, como todo atleta amador que se preze, acabei mordida pelo bicho da competição e tenho feito corridas desde 2002. Adoro, de verdade, mas sempre penso que a vida é feita de compensações. Para compensar tudo de bom que a corrida me traz, tenho de agüentar alguns aspectos desagradáveis.
No último domingo, 5 de março, corri a prova de abertura do circuito da Corpore (Corredores Paulistas Reunidos), na Cidade Universitária. Ótimo evento, dez mil participantes estimados, duas provas simultâneas (5 e 12 km - corri a de 12). Durante o percurso, fiquei atentando para aquilo que eu chamo "As sete porcarias da corrida a pé". Porque enaltecer já virou lugar comum. Em ordem crescente de pentelhação, aí vai minha relação:

7º lugar - Eleanor Rigby
É impressionante a capacidade do paulistano de se meter em congestionamento, mesmo que seja um domingo, às 7h da manhã. O trânsito estava parado antes de entrar na Cidade Universitária. Lá dentro, quarenta minutos para estacionar. O frisson da largada chegando e o desespero batendo. Não tivemos dúvida: largamos o carro na avenida da Raia, no meio da avenida! Tudo bem, um prende o outro, mas todo mundo sai mais ou menos ao mesmo tempo, impera a camaradagem. Mas, sozinha no meu carro, olhava ao redor e via a maioria dos carros também assim, com um único ocupante. Caramba! Será que não tinha ninguém que mora perto de mim e que poderia ter ido de carro comigo? Se todo mundo pensasse - e agisse - assim (eu incluída), teríamos a metade dos carros lá! Olhava ao redor e só lembrava de uma música dos Beatles, que tem tocado muito lá em casa, ultimamente: "Ah, look at all the lonely people...".

6º lugar - Hum, que cheirinho...
Correr no meio de um monte de gente é uma experiência riquíssima em termos de cheiros. No começo, antes da largada, impera o odor de desodorante, com toques do detestável aroma de cânfora, que alguns passam para evitar contusões. Ao longo da corrida, valha-me Deus! Começa a mistureba de perfume, que exala com o suor, cânfora, toques adocicados, advindos de isotônicos e suplementos de carboidrato, e o indefectível cheio de corpo (suor, cecê, catinga, budum - escolha seu termo preferido). Como é impossível prender a respiração, agüente!

5º lugar - Que a força esteja com você!
Eu sei que a intenção é das melhores, mas tenho ímpetos de esganar aquele pessoal da organização da prova, que se posta nas laterais e fica bradando palavras de incentivo a quem está correndo. Fala sério: onde esse pessoal fez curso de estimulação à superação de desafios? Deve ter sido assistindo à série completa do Karatê Kid. "Vamos lá, pessoal!", "Não pára agora, não!". Sempre tenho vontade de falar: "Puxa, obrigada. Se você não me lembrasse de que tenho que correr, era capaz de eu esquecer que ainda faltam cinco quilômetros!"

4º lugar - Cuidado, pista escorregadia
É o mal de correr onde passa carro. Manchas de óleo podem virar ameaças terríveis quando cai uma agüinha. Trechos mal pavimentados são outro perigo constante. Fora olhos de gato e outras armadilhas. Uma vez, correndo na Rubem Berta, durante uma prova, vi um senhor se esborrachar depois de tropeçar num olho de gato. Chocante.

3º lugar - Planeta Água
Sim, precisamos de água, mas os postos de água são um momento de tensão quase indescritível apra mim. Primeiro porque o povo começa a cruzar na sua frente, como se não houvesse amanhã! O problema todo é a atitude dos corredores, que algumas vezes parecem correr como se estivessem sozinhos no mundo. Bebem água, jogam na cabeça e atiram o copo para o lado, à meia altura. Já fui alvejada diversas vezes por esses artefatos! O povo precisa aprender: só joga para o lado se estiver na lateral da pista, e joga alto, porque pode estar vindo alguém para ultrapassar. Caso contrário, simplesmente deixe o copinho cair, junto ao seu corpo!

2º lugar - O que você está fazendo aqui?
Provas simultâneas, como essa de domingo, costumam trazer esse problema: mistura de gente rápida com gente muito lenta. Eu apóio entusiasticamente a criação de provas mais curtas, como as de 5 km, como forma de incentivar novos praticantes, mas pelo amor de Deus, façamos largadas separadas! Pessoas que estão começando a correr são naturalmente mais lentas. E eventualmente correm em grupos, como forma de um incentivar o outro. Sentiu o drama? Mais lento e em grupo: da largada ao final, vão tagarelando, tecendo comentários sobre a prova ou falando da vida, como se estivessem no parque. Nessa prova de domingo, peguei tantos grupos assim, nos três primeiros quilômetros, que fiz esses trechos em marcas acima de 6 min/km, o que prejudicou muito meu tempo final.

1º lugar - Pipi-room
Não poderia ser diferente: o primeiro lugar no concurso das porcarias das corridas a pé vai para... os banheiros químicos! Se existe mesmo o inferno, o umbral ou qualquer outro termo correlato, ele deve ser parecido com um banheiro químico. Todas as sensações de desconforto que um ser humano pode sentir parecem condensadas nessa verdadeira instituição dos grandes eventos públicos. É sujo, abafado, claustrofóbico, desconfortável, cheira mal. Depois de pegar uma fila enorme para usá-lo, encontramos o recanto cheio de papéis fétidos, eventualmente molhado e, claro, com a descarga emperrada. Uma das minhas grandes satisfações, ao fazer provas "menores", como as do Clube Espéria, é poder usar o banheiro de verdade do lugar. Para ver como a vida é feita de pequenas alegrias.

Mas que ninguém se engane: estarei na próxima corrida, a postos, doidinha para bater meu melhor tempo! Quem não veio, venha comigo: as sete porcarias são nada perto das dezenas de maravilhas da corrida a pé!

Thursday, March 02, 2006

O grande armário

Dá uma passadinha lá no GPTotal e veja minha coluna "O grande armário", depois comenta, lá ou aqui.