
Começo pedindo desculpas pela longa ausência. Não sei de onde tiraram a idéia de que o ano só começa depois do Carnaval, pois o meu começou quente. Estou trabalhando como um cortador de cana em plena safra, de sol a sol, mas não reclamo. Costumo dizer que, por trabalhar por conta própria, sou como um táxi - só ganho se estiver ocupada.
Também devo confessar certo desânimo em entrar nessas discussões de pré-temporada na Fórmula 1. Considero isso: a) inútil - quase tudo o que se fala nessa época é pura especulação; b) repetitivo - são sempre os mesmos e óbvios prognósticos, ainda que muitas vezes nós, analistas, quebremos a cara com nossas previsões e raramente façamos mea culpa depois; c) chato - sobretudo chato, já que ficamos parecendo um bando de fofoqueiros.
Leio notícia sobre os testes de inverno e sobre certo desânimo apontado por Fernando Alonso com seu R29. O carro, que é mais feio que o Kubica e o Buemi juntos, pode mesmo ser uma cadeira elétrica, mas prefiro esperar o show começar para dar todo crédito ao espanhol. É que, com vinte e cinco anos de Fórmula 1 no currículo, vivi o bastante para desconfiar de tudo. As palavras de Alonso me cheiram a blefe, e já vi tantos blefes na Fórmula 1... Alonso mal tinha saído das fraldas e eu já cobria os blefes de Ayrton Senna. "Não vou correr pela McLaren neste ano", "Vou correr na Fórmula Indy", blá-blá-blá... O novo Renault pode mesmo ser uma cadeira elétrica - os choques causados pelo KERS reforçam tal inclinação - mas prefiro esperar.
Mas era sobre o KERS mesmo que eu queria falar. Tido como grande revolução tecnológica, o dispositivo que recupera a energia de frenagem para reacelerar o carro é algo já banalizado em alguns sistemas de transportes. Na Europa, várias linhas de trens utilizam soluções semelhantes. No Brasil, veja só, há até ônibus rodando por algumas cidades com uma chamada "célula de combustível", que executa um processo parecido, recuperando a energia gerada pelos freios para reacelerar o veículo. No mundo aqui fora, tais dispositivos servem para economizar combustível e, portanto, otimizar o custo do processo. Com o apelo ecológico bombando em todas as direções, é algo muito bem vindo. E a Fórmula 1 pegou carona, desenvolvendo seu próprio sistema.
As equipes ganharam mais esse quebra-cabeça para atazanar a vida de seus projetistas. Como o brinquedo pesa entre 25 e 40 kg, a relação de peso dos carros mudou. E como o piloto vai dentro do carro, sobrou para ele também. A moda entre a pilotada, agora, é brincar de faquir. Os rapazes, que já eram magros, estão ficando pele e osso. Durante o inverno europeu, Fernando Alonso perdeu 3,5 kg. Meteu-se até com ciclistas de seu país, subindo montanhas para fazer descer o ponteiro da balança. Nico Rosberg, que já era um pau de virar tripa, confessa que passou o Natal contando calorias (teria abdicado do peru?). Se os nanicos Felipe Massa, Nick Heidfeld e Heikki Kovalainen emagrecerem mais, correm o risco de serem levados pelo vento.
Nunca tive muita paciência para aquelas intermináveis discussões sobre "o maior piloto de todos os tempos". Schumacher, Senna, Fangio, Nuvolari, o lenhador austríaco, sei lá mais quem... Parece que a geração atual subverteu essa questão. Estão todos empenhados em ser o menor piloto de todos os tempos.