Vettel à frente, Hamilton atrás: 33 voltas de suspense sem ação |
O encontro marcado de Vettel com a vitória, em Melbourne, parece reeditar o início da temporada, mas o gostinho amargo de energético light (madrugada, amigos...) ficou por outro motivo. Desde a entrada do safety car (na volta 25, 58) tivemos três ameaças de batalhas que resultaram em nada. Hamilton no encalço de Vettel, Daniel Ricciardo ameaçando Kimi Raikkonen e Max Verstappen crescendo no retrovisor de Fernando Alonso. Ultrapassagem? Zero.
É certo que esse tem sido um problema recorrente, nos últimos anos na Fórmula 1. Criaram até uma comissão para enfrentar o problema. Inventaram uma asa móvel que facilita o trabalho de quem está atrás - e deixa o piloto à frente mais vulnerável, segundo eles mesmos. Às vezes, resolve. Em Melbourne, não costuma resolver. Neste ano, criaram uma terceira zona para ativação dessa asa, em vez das tradicionais duas. Resultado? Nenhum.
É lindo e empolgante ver Vettel e Hamilton duelando pela ponta, cada um fazendo sua volta mais rápida como resposta ao desafio proposto pelo adversário, na volta anterior. Mas, diante da ação em suspense, o espectador quer ver o desfecho do filme. A música mais agradável ao ouvido é aquela cuja melodia apresenta um fraseado que se resolve em um harmonioso acorde final. O prazer prolongado vira explosão quando se transforma em orgasmo (tirem as crianças da sala).
Ninguém aguenta trinta e três voltas de preparação para... nada.
A cada novo ano, a Fórmula 1 parece o casal de amantes que se encontra uma vez por ano, cheio de expectativas e saudades, para ao final do fim de semana voltar à sua rotina de sempre. Em linhas bem cruas, esse é o resumo da peça "Tudo bem no ano que vem", de Bernard Slate, depois transformada em filme de Robert Mulligan. E se parece cada vez mais com o roteiro da Fórmula 1, nos últimos anos.
Encontrar os responsáveis por essa situação pode ser uma aventura arqueológica, pela qual se escave o passado da categoria para descobrir, no final, que a Fórmula 1 sempre foi assim. Mas o campeão mundial de 1996, Damon Hill, meteu-se em uma treta saborosa com a Mercedes, ao apontar, feito um Daniel Blake no filme de Ken Loach, que a culpa por tudo isso é das corporações. Vale a pena estourar a pipoca e ler a sequência de alfinetadas mútuas. Estariam certos os arqueólogos da categoria, mas Damon também não está errado. Como sair desse nó? A Liberty Media, que administra a Fórmula 1 atualmente, parece estar tentando, mas também é nítido que, cedo ou tarde, vai ter que se entender (ou se desentender) com essa situação.