Tuesday, June 26, 2012

Gilberto Gil, 70

Hoje, Gilberto Gil completa 70 anos. Republico um post de alguns anos atrás, que escrevi sobre as canções "Flora" e "Drão".

Vida longa a Gil!

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Em 1981, quando Gilberto Gil lançou o disco "Luar", pouco prestei atenção à faixa "Flora", dedicada à então jovem esposa do hoje ministro. Aquele disco teve muitas músicas de sucesso, como "Palco", "A gente precisa ver o luar", "Cores Vivas", "Se eu quiser falar com Deus" e "Lente do Amor", esta última tema de abertura do seriado "Amizade Colorida", da TV Globo. Um tremendo disco! O fato de eu não prestar tanta atenção a "Flora" talvez tenha tido relação com a maior divulgação das outras músicas. Ou também por outra razão: com apenas 11 anos, na época, eu talvez não tivesse mesmo sintonia com uma música de amor tão delicada, nem maturidade para entender o conteúdo e a profundidade daqueles versos.

No ano seguinte, Gil lançou o também admirável "Um Banda Um", que tem "Andar com Fé", "Metáfora", "Esotérico" e "Drão", uma das mais tocadas do disco, dedicada à ex-esposa de Gil, Sandra, conhecida entre amigos e familiares como Drão, corruptela de Sandrão. Nunca esqueci o comentário da minha mãe, naquela época. Antes, cumpre-se informar que minha mãe é de Touro. Do pouco que entendo de Astrologia, e entendo pouquíssimo, sei que os taurinos são o ápice do ciúme. Ela disse algo como: "Se eu fosse a mulher do Gil, mandava ele passear. Como é que faz uma música para a ex-mulher mais bonita do que a que fez para atual?"

Não contestei a opinião dela e acho até que vivi alguns anos concordando que "Drão" era mais bonita que "Flora". Até que um dia, ouvindo a gravação do show "Trem Azul", o último de Elis Regina, subitamente me vi tocada às lágrimas com "Flora", que Elis provavelmente gravaria no disco planejado para aquele 1982 fatal. Naquele momento, "Flora" revelou-se para mim e definitivamente contestei minha mãe (não que tenha dito isso para ela; ela provavelmente só saberá da minha discordância quando - e se - ler este post.)

"Flora" revela o amor maduro de Gil por uma mulher que se afigura a ele como a musa eterna. Olhando para a jovem, ele nela enxerga seu próprio futuro. Vislumbra a jovem como idosa e se vê ao seu lado, vivendo da sombra de sua maturidade, trocando mesmo de papel. No presente, o poeta é um homem vários anos mais velho que a amada e lhe transfere a condição de segurança e sabedoria. No futuro, ela é a árvore frondosa, sob cuja copa ele contempla a própria vida, multiplicada em frutos - sonhos, filhos - de uma existência conjunta, única, uma amálgama de dois seres. Como se já não existisse o velho e a jovem, nem o homem e a mulher, mas um único ser, unificado em uma realização comum, a materialização genuína do amor.

"Drão" é o hino de um amor transformado, a ode a uma relação localizada no passado, intensa e igualmente frutífera, mas que se sublimou em outro tipo de amor. Não por acaso, "Flora" é uma árvore, forte, plantada, fincada na vida do poeta, enquanto "Drão" recorre igualmente à idéia do grão, da geração da vida que, no entanto, tem que morrer para germinar, desprender-se da terra, tornar-se infinito, ganhar a amplidão do espaço para assim se realizar. "Drão" é, sim, uma declaração de amor de Gil a uma musa, mas de um amor que não é mais o amor que costumava ser, ou que se percebeu diferente ao longo do tempo, na descoberta de outras formas de amar, talvez mais intensas, ou mais perenes, ou mais completas.

Em "Flora", o poeta joga-se nas mãos da musa, coloca nela seu futuro e a crê para sempre. Em "Drão", Gil consola-se e consola a musa do fim de um amor que só poderia ter esse destino, mas que nem por isso deixou de ser amor.

Os poetas talvez saibam amar melhor que nós outros.

Veja as letras das duas canções, abaixo, e fique muito à vontade para dizer se concorda comigo, com minha mãe ou, na linha do que diria o próprio Gil, se "a complexidade do tema está justamente na contraposição das expressões diversas da manifestação amorosa".

Flora
(Gilberto Gil)

Imagino-te já idosa
Frondosa toda folhagem
Multiplicada a ramagem
De agora

Tendo tudo transcorrido
Flores e frutos da imagem
Com que faço essa viagem
Pelo reino do teu nome
Ô, Flora

Imagino-te jaqueira
Postada à beira da estrada
Velha, forte, farta, bela
Senhora

Pelo chão muitos caroços
Como que restos dos nossos
Próprios sonhos devorados
Pelo pássaro da aurora
Ô, Flora

Imagino-te futura
Ainda mais linda madura
Pura no sabor de amor
E de amora

Toda aquela luz acesa
Na doçura e na beleza
Terei sono com certeza
Debaixo da tua sombra
Ô, Flora

Drão
(Gilberto Gil)

Drão
O amor da gente é como um grão
Uma semente de ilusão
Tem que morrer pra germinar
Plantar n'algum lugar
Ressucitar do chão
Nossa semeadura
Quem poderá fazer
Aquele amor morrer
Nossa caminhadura
Dura caminhada
Pela estrada escura

Drão
Não pense na separação
Não despedace o coração
O verdadeiro amor é vão
Estende-se infinito
Imenso monolito
Nossa arquitetura
Quem poderá fazer
Aquele amor morrer
Nossa caminhada dura
Cama de tatame
Pela vida afora

Drão
Os meninos são todos sãos
Os pecados são todos meus
Deus sabe a minha confissão
Não há o que perdoar
Por isso mesmo é que há de haver
Há de haver mais compaixão
Quem poderá fazer
Aquele amor morrer
Se o amor é como um grão
Morre e nasce trigo
Vive, morre pão

Monday, June 18, 2012

O Google jogou fora o blog do meu filho de 12 anos. Ele quer o conteúdo de volta.

Meu filho, Gabriel Pandini, criou um blog em 2007, quando tinha sete anos. Há pouco menos de duas semanas, o Google, proprietário das marcas Gmail e Blogspot, tirou o blog do ar. Reproduzo abaixo o texto de Luiz Alberto Pandini, pai do Gabriel, publicado originalmente no blog PandiniGP:

"Creio que todos os leitores deste blogue sabem que meu filho Gabriel, de 12 anos, se dedicava desde os sete a seu blog, o Saco de Batatas. "Dedicava" porque, há duas semanas, o Google cancelou a conta de Gmail do Gabriel e, junto dela, o blogue que ele mantinha, bem como o acesso ao sistema administrativo.


Motivo? Segundo o aviso que apareceu ao tentar acessar seu e-mail, Gabriel "violou a política do Google" por ter menos de 13 anos - a idade mínima estabelecida pelo Google para alguém poder ter uma conta de Gmail. Curioso é que Gabriel sempre informou sua idade verdadeira e demorou "apenas" cinco anos para alguém reparar que Gabriel havia "violado a política do Google". Incoerente, para dizer o mínimo.

Durante cinco anos, Gabriel se dedicou ao seu blog com o cuidado, carinho e interesse compatíveis com sua idade ao longo desse tempo. Era, para ele, uma diversão. Seu blogue já foi tema de reportagens no "Estadinho" (suplemento infantil de "O Estado de S. Paulo") e na revista "Recreio". Para o mesmo "Estadinho", Gabriel escreveu uma reportagem de duas páginas sobre a Stock Car e o piloto Chico Serra. No ano passado, um pouco antes do GP do Brasil, Gabriel fez "a melhor entrevista do ano" com a fera da F1 Mark Webber (as palavras são do próprio; áudio e texto podem ser ouvidos no link graças à Car and Driver, que publicou a entrevista em seu blogue). No final do ano passado, o camarada Luc Monteiro, a quem prezo duplamente (pela amizade e pela competência de sua locução, vibrante sem apelar para gritarias histéricas ou chavões repetitivos), manifestou irrestrita confiança no futuro de Gabriel como comunicador. Há menos de duas semanas, por ocasião do GP do Canadá, Gabriel fez sua estreia oficial no rádio: participou da equipe de comentaristas comandada por Odinei Edson na Band News. E saiu-se muito bem.

Pois é, "seu" Google. Foi o trabalho deste garoto que sua brilhante equipe tratou como lixo. Tentei resolver o caso amigavelmente com o Google por vias diplomáticas. O que pedi era muito simples: que o conteúdo do blogue (textos, fotos e comentários) fosse salvo e restituído ao Gabriel. Nada consegui, apesar da boa vontade de algumas pessoas que tentaram nos ajudar. Por isso, reproduzo abaixo, ipsis literis, o texto que Gabriel escreveu indignado há duas semanas, quando o "Saco de Batatas" foi tirado do ar."


TIRARAM MEU BLOG DO AR; TRABALHO DE MAIS DE CINCO ANOS TOTALMENTE PERDIDO!


Eu passei por uma experiência péssima hoje. Simplesmente, sem nenhum aviso, meu blog foi encerrado e minha conta de e-mail, removida. Estou indignado. Foram 5 anos de um trabalho feito com dedicação. Mais de 700 postagens desde o dia 15 de outubro de 2007. 3 reportagens feitas com o meu blog, duas delas com o Estadinho e uma com a revista Recreio. Por que em 2007 ninguém viu problema? Eu não sou mais marionete nas mãos do Gmail. Agora, para mim, Gmail e Google são palavrões. Qual o objetivo de tirar o blog de uma criança do ar? Eu nunca escrevi nada imoral ou que ofendesse alguém. Pelo contrário. Muitos já me parabenizaram por causa do meu blog. Conselho de amigo: deixem o Gmail de lado e partam para qualquer outro e-mail. De duas, uma: Ou pensam que eu sou um estúpido e não vou notar nada, ou as pessoas do Google são muito sacanas.

Gabriel Pandini, 5 de junho de 2012

O Google frustrou uma criança. Parabéns. Poucas maneiras são mais eficientes que esta para uma empresa angariar antipatia generalizada.