Saturday, October 27, 2007

And the Fangio goes to...

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Encerrada a temporada, chega o momento de eleger os melhores da Fórmula 1 em 2007. A-do-ro eleições do tipo "o melhor" de qualquer coisa. Convido os amigos a ler minhas escolhas e a apresentar suas próprias, inclusive com a liberdade de criar novas categorias.

Como não existe Oscar da Fórmula 1, crio o Troféu Fangio, em homenagem àquele que, mesmo superado em termos de títulos, é considerado o melhor de todos os tempos - o argentino Juan Manuel Fangio. Daria o nome dele ao prêmio nem que fosse apenas por sua simpatia e gentileza, características que vi de perto, em um memorável encontro com a imprensa em São Paulo, no já longínquo ano de 1992.


Melhor piloto - discussão para mais de metro, e argumentos não faltam. Digo e reafirmo que o melhor piloto da atualidade, para mim, é Fernando Alonso, que reúne duas características raras na mesma pessoa. É arrojado quando precisa (vide Nurburgring 2007) e cauteloso quando convém. Quase uma mistura de Senna e Prost, o que parece impossível como misturar água e óleo. Mas 2007 não foi o ano de Alonso, que fez corridas irreconhecíveis, como o GP do Canadá. Custo a acreditar que vou dizer isso, porque continuo achando o finlandês um piloto displiscente, mas não há como negar que o campeão deste ano foi a personificação da eficiência quando era eficiência o que se esperava dele, além de ter ganho o maior número de corridas no ano. Portanto, Kimi Raikkonen.

Melhor carro - pode ter sido copiado da Ferrari, mas o fato é que o McLaren-Mercedes de 2007 é o caso de criatura que supera o criador. Não quebrou uma única vez neste ano e acaba sendo um caso raríssimo de carro rápido e confiável que não leva o título. Para que tenhamos certeza de que não basta, não, colocar um macaco no comando das máquinas... (adendo: lembrando que esta é uma referência à célebre frase de Niki Lauda, dizendo que os Fórmula 1 atuais são tão fáceis de pilotar que até um macaco o faria.)

Melhor equipe - a Ferrari cometeu erros grotescos ao longo do ano e parecia ter se perdido ou estar acusando demais a falta de Michael Schumacher e Ross Brawn. Mas fechou-se em torno de Kimi com devoção, trabalhou com competência e fez o que precisava para garantir os títulos de Construtores e Pilotos. La famiglia continua dando as cartas.

Melhor desempenho em uma equipe média - Não dá para comparar o desempenho de pilotos do chamado G4 com os demais. Da mesma forma, há um claro desnível entre as equipes médias e as do fundão do grid. A BMW terminou em segundo no Mundial de Construtores pela desclassificação da McLaren. De fato, seus carros vêm em uma evolução notável. Não podemos nos esquecer de um detalhe: aquilo era uma Sauber, minha gente! Mas, honestamente, Heidfeld e Kubica não fizeram meus olhos brilhar ao longo do ano. Kubica protagonizou pegas eletrizantes ao final de algumas corridas, além de ter se recuperado plenamente depois de uma panca assutadora no Canadá. Mas, se a idéia é premiar alguém que não tem um carro voador e fez bonito, meu voto vai para Nico Rosberg, especialmente pela segunda metade da temporada. Torço para ver esse rapaz logo em uma equipe grande.

Melhor desempenho em uma equipe pequena - Fácil. Sebastian Vettel. O alemãozinho já mostrou qualidades ao acelerar o carro da BMW desde o ano passado como piloto de testes, mas seu quarto lugar no GP da China foi uma recuperação para lá de madura depois de uma lambança vexatória no GP do Japão. Este quarto lugar, aliás, talvez tenha sido o resultado mais expressivo de toda a temporada. Outra vez, vale a pena lembrar. A Toro Rosso, minha gente, é uma Minardi!

Revelação do ano - Ah, não vou nem perder muito tempo nisso. Lewis Hamilton fez história e só uma mente perturbada como a de Ron Dennis poderia ter feito o estrago que fez. De piloto popular e querido por todos, transformou Hamilton no anti-Cristo da categoria.

Fiasco do ano - Outra fácil: o desempenho da Honda. Pior que Spyker e Toro Rosso juntas, porque tem toneladas de investimentos por trás. Se o futuro do planeta dependesse da Honda, eu já estaria comprando minha passagem para Marte.

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Agora, é com vocês.

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E basta! Salvo aconteça algo de extraordinário, com este post vou dar um tempo nos assuntos de automobilismo. Sinto que os freqüentadores do blog que não gostam tanto de corrida estão já entediados. Vamos falar de música, de literatura, de poesia, de comportamento, da vida? Venham comigo e continuem lendo minhas colunas sobre automobilismo no GPTotal.

Wednesday, October 24, 2007

One

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Já está no ar minha nova coluna no GPTotal. Em pauta, Ferrari, McLaren e o U2. Hein?! Vai lá, comenta aqui!

Sunday, October 21, 2007

O sonho

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Em dez de julho deste ano, anunciei neste post o fim da temporada de Fórmula 1 de 2007. Sonhei que Kimi Raikkonen seria campeão, o que foi nonsense naquela época, porque o finlandês fazia uma temporada bem mequetrefe até então. Quer dizer, mequetrefe na comparação com Lewis Hamilton, Fernando Alonso e Felipe Massa.

É certo que, do GP da França para frente, Kimi somou mais pontos que os outros três, mas ainda assim chegou com status de zebra a Interlagos.

E eu cheguei a Interlagos, neste domingo, a bordo de um Corcel II.

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Acredite se quiser: este dia com clima de Saara começou, para mim e para Victor Martins, com chuva! Mais uma vez, passei na casa do solerte repórter às sete da matina, para tomarmos juntos um chá de cadeira ainda mais longo à espera do bolchevique Flavio Gomes. Certo é que chegamos à Zona Sul já com sol. Confesso que estava um pouco tensa com o tipo de veículo que Gomes iria nos impor. É duro viver sob esses regimes totalitários. Mas Gomes hoje mostrou-se um déspota esclarecido e nos levou a bordo de um Corcel II 1979, que só pelo fato de ter janelas já ganhou de longe do Candango da véspera.

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Fábio Seixas, da Folha de S.Paulo e da Rádio Bandeirantes, Victor Martins e Flavio Gomes, do site Grande Prêmio


No caminho, mais um papo esperto com o simpático Fred, amigo sueco do camarada Gomes. Falamos sobre Ronnie Peterson e sobre sua esposa, Barbro. Fred também tentou me convencer a ir esquiar nos Alpes. Fiz cara de pouco entusiasmo, explicando que detesto frio e adoro sol. Fred, simpático senhor de cristalinos olhos azuis-verdejantes, arregalou-os, incrédulo. "Você até parece uma carioca bronzeada falando desse jeito."

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Quem gosta de esquiar nos Alpes é o Ico, que encontramos assim que estacionamos o Corcel II. (Por favor, coloquem reparo no respeito diferenciado ao digno automóvel do domingo. Meu pai teve dois ou três Corcel II no final dos anos 70. Jamais chamarei algum deles de lata velha.) Ico estava com seu sorriso sereno de sempre, mas de repente pareceu ter um insight. "Estou sentindo um clima diferente aqui hoje, vai dar zebra." Talvez tenha sido por isso que, no início da transmissão da rádio, eu tenha cravado palpite em vitória de Kimi Raikkonen, com Felipe Massa em segundo. Sim, fiz isso, apesar de ontem ter escrito aqui que esperava vitória de Massa no GP, com Hamilton campeão. Apostei ma intuição do Ico e acabei acertando.

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E a confiança inexplicavelmente cresceu a ponto de eu chamar Barbara Gancia para uma aposta. Ela havia apontado Massa e Hamilton como vencedores, respectivamente, do GP e do campeonato, como eu fizera ontem. Apostei a moeda de troca recorrente de Barbara - um picolé de limão. Ela topou. Só não me pagou até agora, mas me parabenizou no ar.

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Ao longo da transmissão, depois do inacreditável erro de Hamilton, mencionei que o inglês talvez tivesse sido vítima da ancestral maldição da categoria de acesso. Nunca nenhum vencedor da Fórmula 2, da Fórmula 3000 ou da GP2, as categorias que ao longo da história têm funcionado como último degrau antes da Fórmula 1, foi campeão na categoria principal.

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A disputa entre Nico Rosberg e Robert Kubica pelo quarto lugar, ao final da prova, chegou perto de dar bobagem. Na cabine da Band, outro comentarista convidado, o líder da Stock Car, Cacá Bueno, chamava a atenção para a proximidade perigosa dos dois. O pega mais acintoso era na entrada do S do Senna, imagem que nem sempre a televisão mostrou. Assim que a BMW e a Williams passavam, imediatamente Cacá e eu levantávamos para conferir o que ia sair daquela briga. Um toque entre os dois poderia significar o título para Hamilton, que herdaria duas posições e assim ultrapassaria Raikkonen. Mas, no íntimo, não achei que Kubica permitiria um inicidente que favorecesse Hamilton. Depois do entrevero entre o polonês e o inglês, no Japão, Kubica tornou-se o segundo maior desafeto de Hamilton na categoria. Perguntado sobre quem ele achava que seria campeão, foi direto: "Qualquer um, menos Hamilton".

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No GP da China, Ron Dennis disse que não estava lutando contra Raikkonen, mas contra Alonso. Na minha mente, ecoa a melodia de um velho rock dos Mutantes: top, top, top.

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O repórter Julio Gomes, da Band News, tirou um sarro de leve da minha cara, depois da transmissão, já na sala de imprensa. Em minha última intervenção na rádio, eu admiti que estava extremamente emocionada ao final da prova, e estava mesmo. Não torço pela Ferrari, embora tenha leitor aqui que não se convença do contrário, nem em especial para Raikkonen. Torcer eu torcia pelo Corinthians, quando estava na ativa, só que agora me aposentei. Mas ver Raikkonen campeão foi a concretização daquela que me parecia a única saída digna para a Fórmula 1. Lewis Hamilton e Fernando Alonso são pilotos bons demais para levarem um título manchado pela má conduta da McLaren. Não merecem isso. Enxerguei no título de Raikkonen uma vitória do esporte. Esporte que eu amo, que preenche minha vida de emoção. Sim, Julio, fiquei emocionada. Não chorei, mas pode rir. Eu, pelo menos, não tenho um irmão que dirige um carro sem janela.
Atualização: registre-se que Julio também apostou em Kimi no início da transmissão. Mas não apostou com a Barbara, por isso ela só deve o picolé para mim.

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Hamilton ontem estava com nove dedos na taça. O dedo que faltava ele talvez hoje esteja chupando.

Coitado...

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Vamos ser bem sinceros? Foi uma expectativa imensa, da primeira à última volta. Mas corrida espetacular, mesmo, só quem fez foi... Lewis Hamilton. Cometeu dois erros fatais no início da prova, primeiro na disputa com Alonso, depois no engate equivocado em um câmbio semi-automático. Fórmula 1 é jogo de erros. McLaren e Hamilton erraram pouco ao longo da temporada, mas erraram em momentos cruciais. Depois de cometê-los, Hamilton partiu para a chamada corrida de recuperação e foi galgando posições, enquanto os líderes pouco se arriscavam. Menção honrosa para mais uma excelente prova de Nico Rosberg. De resto, sobrou a ansiedade pelo título. Persiste o paradoxo da temporada de 2007: como pode um campeonato ser competitivo se as partes que o compõem - as corridas - são tão previsíveis?

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Na próxima quarta-feira, minha análise sobre o GP do Brasil de 2007, no GPTotal.

Saturday, October 20, 2007

Nove dedos

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Depois da definição do grid para o GP do Brasil de 2007, Lewis Hamilton está com nove dedos na taça de campeão da temporada. Larga em segundo, com os dois oponentes - Raikkonen e Alonso - em terceiro e quarto. Felipe Massa fez tanta festa depois da pole, subindo no que ele mesmo chamou de "Mureta Massa", que quase eclipsou o panorama francamente pró-Hamilton e totalmente contra-Alonso do treino classificatório.

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A transmissão da Band News/Bandeirantes foi repleta de informações, porque a rádio - oficial do Grande Prêmio - tem um esquadrão de repórteres em Interlagos. Na primeira vez em que participei como convidada, no GP da Turquia, fizemos do estúdio, com a equipe habitual: o locutor Odinei Edson, os comentaristas Fábio Seixas e Jan Balder, o repórter Júlio Gomes e o âncora Luis Megale. Desta vez, o time está muito mais completo. Dei muita risada com Barbara Gancia, minha ex-colega de Folha de S.Paulo, que fez uma entrevista impagável com Sarah Feruguson, a Duquesa de York, ex-mulher do príncipe Andrew, da Inglaterra.

Barbara deve ter assistido a todos os GPs do Brasil, em Interlagos e em Jacarepaguá, mas vibra como se fosse o primeiro ao anunciar do ronco dos motores. "Não é lindo isso? Um motor que chega a 19 mil giros?! Eu adoro isso, é minha cachaça!", empolgava-se toda. É a nossa, Barbara. À nossa, Barbara, tin-tin!

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Outro ex-colega de Folha que encontrei na sala de imprensa foi Edgar Alves, o decano do Esporte. Ganhei abraço apertado e agradecimento especial, só por causa daquele post que escrevi no começo do Panamericano, homenageando o grande repórter pelo Pan de Cuba, de 1991. Daí nos pusemos a lembrar de outras coberturas que fizemos juntos, inclusive alguns GPs do Brasil. É sempre muito bom rever amigos...

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Mais um momento de alegria: encontrar o Ico em carne e osso pela primeira vez, nesta atual passagem do querido colega por São Paulo. Luis Fernando Ramos, o Ico, companheiro de GPTotal, está sofrendo uma barbaridade com o trânsito daqui. Mora em Viena e passa alguns meses no estranho habitat a que nós, os outros, nos acostumamos. Certo está ele, por não se acostumar.

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Antes de chegar, ah, que aventura! Pedi carona ao socialista Flavio Gomes, ele e sua frota de incontáveis latas velhas que ele chama de carros antigos, ou clássicos, sei lá. Fomos, eu e Victor Martins, da Zona Norte de São Paulo até o elegante bairro onde mora o companheiro. Deu-nos um insípido chá de cadeira, mas nem foi o pior. Apareceu a bordo de um veículo de 1961, chamado "Candango", uma espécie de jipe de guerra. Que foi para a guerra. O célebre torcedor da Lusa ainda dignou-se a dar carona para um amigo sueco. Sem noção. A geringonça faz barulhos de toda sorte, não tem janela, só aquelas lonas vagabundas que se prendem com pouca precisão e muita sorte. Fato é que o tal meio de transporte chamava mais atenção do que todos os importados bacanudos que entravam no autódromo ao mesmo tempo que nós. Agora, torço para Gomes não ler estes impropérios até a manhã de domingo, quando espero pegar carona novamente com ele. Oh, Deus, o que me aguarda?

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Circulando pelo paddock, um monte de ex-pilotos que hoje cumprem expediente em funções diversas na Fórmula 1. Gerhard Berger, que era bem charmosinho, está rechonchudo e bem calvo, cuidando dos interesses da Toro Rosso. Niki Lauda, coitado, que já era de assustar, depois de velho não poderia estar melhor. E pior: também engordou horrores.

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Uma cena habitual - celebridade no paddock. Passa por mim a gigantesca Naomi Campbell, indo em direção ao minúsculo Bernie Ecclestone. Uma com tanta perna, outro com tanto dinheiro. Cumprimentam-se, beijam-se, um festival de clicks de uma multidão de fotógrafos. Não pude deixar de pensar: se ela fosse feia ou se ele fosse pobre, nem se olhavam.

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Palpite para a corrida: vitória de Massa.
É notável como Felipe Massa parece lidar tão bem com o fato de "jogar em casa". Pelo segundo ano seguido, fez a pole em um Interlagos lotado de torcedores vibrando por ele. Não deixa a torcida virar pressão. Pena que Rubens Barrichello não tenha conseguido essa mesma química enquanto esteve na Ferrari, sucumbindo à pressão de correr na própria cidade.

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Palpite para o campeonato: título para Hamilton.
O inglês pontuou em 94% das provas de que participou. Tem mostrado equilíbrio e não se intimida em pistas desconhecidas para ele. Parece muito difícil que perca a vantagem que conquistou até agora. Acho que neste domingo, 21 de outubro, a Fórmula 1 vai coroar um campeão que entra para a história quebrando muitos paradigmas.

Espero vocês na Band News/ Bandeirantes AM e FM. Até lá!

Thursday, October 18, 2007

Nas ondas do rádio

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Neste final de semana, vou participar mais uma vez como comentarista convidada da transmissão da Fórmula 1, pela Rádio Bandeirantes, no GP do Brasil. Estarei no ar no sábado, durante o treino classificatório, às 14h, e no domingo, durante a corrida, no mesmo horário.

Quem quiser ouvir pode sintonizar nas rádios Band News FM (96,9), Bandeirantes FM (90,9) e Bandeirantes AM (840). Outra possibilidade é ouvir pela internet: www.radiobandeirantes.com.br, clicando no link "Ouça agora".

Mais um detalhe: também é possível enviar perguntas e comentários durante a transmissão, pelo site da BandNews. Vamos nos encontrar lá?

Mais uma vez, agradeço ao Odinei Edson pelo convite.

Saturday, October 13, 2007

Corintiana aposentada



Há exatos trinta anos, caí aos seus pés. Inexoravelmente, irremediavelmente, sofredora e maloqueiramente. Não fosse minha auto-estima tanta, teria até pena de mim mesma. Coitada, tão menina ainda, sete anos só, e já enlaçada desse jeito...

13 de outubro de 1977. Parece mesmo coisa de destino, mandiga ou sei lá. Morávamos na casa da minha avó, por uma daquelas circunstâncias da vida que nunca ficam bem explicadas. A avó ficou viúva e não queria sair da casa, mas também não queria ficar sozinha. Mudamos para lá. Era um casarão, coitado, que também já não existe mais. Pois eu fiquei sozinha na sala vendo o jogo, sozinha naquele casarão enorme. Meu pai, que acordava cedo e não torcia por você, foi dormir. Minha mãe o acompanhou. Meu irmão tinha só dois anos. Sobrei eu. Por quê?

Talvez porque eu já tivesse o dom de farejar notícia, coisa histórica, marcos indeléveis da humanidade. Ou porque sofria a influência determinante dos meus tios Edgar e Edson, este último já adulto, pai de família e sem nunca ter visto você campeão. Ou porque eu já me sabia com pendor inato para o masoquismo dos que te veneram. Fiquei e vi.

Vi aquela bola desgraçada que não entrava de jeito nenhum. Vi pela primeira vez o que é um bololô na área e vi quando a distinta finalmente achou o caminho da rede. Vi que o autor do gol se chamava Basílio, e achei graça porque era o mesmo nome do elefante do Érico Veríssimo, personagem principal do primeiro livro que li na vida, naquele mesmo ano. Viu? Eu tinha só sete anos e um único livro lido, e já estava fascinada por você.

Vi Dulcídio Wanderley Boschillia apitar o fim do jogo e vi a multidão invadir o campo. Vi a Polícia Militar fazer um cordão de isolamento e ir marchando pelo gramado, varrendo os loucos mais loucos que eu que atravessavam o campo de joelhos. Vi a taça ser erguida, vi minha mãe e meu pai descerem, acordados pelos fogos. Não vi, mas ouvi uns doidos passando pela rua, gritando algo que me soou altamente transviado, transgressor, além de pornográfico: “êta, êta, êta, pau no c... da Ponte Preta.”

Naquela noite, há trinta anos, você me capturou e estampou em mim o selo da fidelidade total. Uma fidelidade canina, que me fazia cada vez mais adorar você, seus símbolos, o branco e o preto, e cada vez mais rechaçar tudo o que não fosse você, especialmente qualquer coisa que tivesse verde. Passei anos sem ter uma única peça de roupa verde no guarda-roupa. Minha cozinha é preta e branca, minha sala de TV, também. Quando meu filho era bebê, no afã de incutir-lhe a mesma repulsa a seu maior rival, eu candidamente dizia a ele, enquanto trocava suas fraldas sujas de detritos sólidos: “Vamos tirar essa palmeirice do bumbum...”.

Não vou negar, tivemos momentos maravilhosos juntos. Depois da quebra do tabu, em 1977, a primeira conquista marcante foi o bicampeonato paulista, 1982/1983, com aquele time da “Democracia Corintiana”. Vínhamos, os brasileiros, do trauma da Copa da Espanha, e nós, corintianos, pelo menos nos redimimos com aquele título tão gostoso de ganhar, em cima do São Paulo, com bola no meio das pernas do goleiro e tudo. Sócrates, Casagrande, Wladimir, Zenon, Biro Biro...



A década de 1990 também nos foi próspera. Começou com o primeiro título brasileiro, também em cima do São Paulo, um campeonato de um homem só – Neto. Talvez seu título mais festejado por mim tenha sido o Paulista de 1995, em cima do Palmeiras, com a final disputada em Ribeirão Preto (e Branco?). Pouco depois, o bi brasileiro, uma vez em cima do Cruzeiro. A outra, do Atlético.

Tivemos, como em toda relação, fases menos felizes, por exemplo, as derrotas para nosso maior rival na Libertadores. Lembro também, com o peito apertado, da derrota na final do Paulista de 1987, para o São Paulo, depois de uma reação fulminante que nos levou da lanterna para o vice. Altos e baixos, normal, todo relacionamento longo tem disso.

O problema é que, nos últimos anos, começou a bater um cansaço, um desânimo e, pior, uma indisfarçável vergonha. São trinta anos de dedicação, sinto-me o funcionário exemplar que, ao final da carreira, percebe que deu mais do que recebeu. Talvez seja uma sensação reforçada pelos últimos e lamentáveis tempos. Não fico tão chateada por pensar que sua diretoria nos deixou sem time e sem títulos. Dói é saber que ela nos deixou sem argumentos. Não posso mais rebater acusações de que ganhamos roubado. Seu presidente admitiu isso, vou eu negar?

Talvez eu simplesmente esteja deslocada. Coisa de empregado antigo, cheio de lembranças e de certa melancolia. Não é que eu esteja com raiva de você, nem que vá mudar de time. Serei mesmo como o funcionário aposentado, que apenas não está mais no dia-a-dia da empresa. Pode me convidar para as datas especiais, compareço com o maior prazer. Mas, agora, vou descansar. Abro mão de assistir e/ou escutar todos os jogos, menos ainda vou me dedicar a discutir e argumentar em seu favor, onde quer que eu esteja. Não vou jogar fora o top que uso para treinar na academia, com seu escudo estampado no peito. Mas também não me nego mais a usar uma ou outra peça de roupa verde. Uma ou outra, porque também não é assim...

Trinta anos, Corinthians, e eu permaneci aqui, impávida, sofredora, maloqueira, fiel. Estou me aposentando, mas estarei por perto. Como acontece em muitas empresas, às vezes os velhinhos são chamados a retornar. Caso você arrume tudo por aí, pode me chamar, vamos conversar. Na mesa de negociação, não esqueça de apresentar a única coisa da qual não abro mão para voltar: sua dignidade.

Wednesday, October 10, 2007

Minta você mesmo

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No ar, minha mais nova coluna no GPTotal. Em pauta, as ligações perigosas entre a imprensa e os personagens principais da Fórmula 1. Vai lá, vai...

Monday, October 08, 2007

Milagre



Depois do GP do Japão, Fernando Alonso disse que só um milagre o levaria ao título da temporada. Pois ele veio, na China. Pouco depois de Hamilton cometer seu primeiro e talvez fatal erro no ano, eu estava mais interessada em outra corrida, o Circuito das Estações, realizado a cada três meses no Estádio do Pacaembu.

A corrida da Primavera foi muito bem organizada, e igualmente sofrida. Sol forte desde cedo, o inclemente asfalto do Minhocão e o falso-plano da avenida Pacaembu, a nos conduzir de volta ao estádio. Correr esta prova é reviver, em parte, a São Silvestre, pelo trecho sobre o elevado. A diferença é que, agora, já não sinto aquele abandono de solidão que me invadiu naquele trecho. No lugar das nuvens negras de dezembro, o sol soberano de uma manhã de outubro.

Cumpri os 10 km em 50 minutos cravados, mais do que eu gostaria (o objetivo era fazer abaixo de 50), mas com alto grau de satisfação após a prova, justamente pela dificuldade imposta pelo clima quente e seco.

A equipe Conexão, capitaneada pelo técnico Zé Eduardo Pompeu, compareceu em massa. Congraçamento antes e depois da prova, e um bônus considerável: a programação musical da corrida está cada vez melhor. Largamos ao som de U2, "Where the streets have no name". Cheguei embalada em "Start me up", dos Rolling Stones. Uma apoteose, em resumo.

A agitação toda acontece dentro do estádio, em volta do gramado. O são-paulino Zé, dado momento, fez um gracejo com as cores recém-pintadas da arquibancada. "Caraca, véio, o Corinthians mandou pintar a arquibancada de roxo?", para depois prognosticar - "Acho que hoje o São Paulo perde...". Duvidei. Só por milagre.

Enquanto toda a blogosfera automobilística dava tratos à bola e produzia pérolas saborosas sobre o GP da China, como no aqui, aqui e aqui, eu descansava os músculos sacrificados na piscina do clube. Confesso, pensava mais em Hamilton que em Betão. Assisti ao primeiro tempo do jogo no restaurante, sem muita atenção, sem nenhum entusiasmo.

Cheguei em casa e ouvi gritos. "Pronto, gol do São Paulo". Só por curiosidade, liguei a TV e vi a cena mais corintiana dos últimos tempos. Um zagueiro, tido como grosso, comemorando um gol aos 41 do segundo tempo. Um zagueiro meio tosco, capitão do time, caindo no choro diante do tabu derrubado.

Para efeito de classificação, o milagre corintiano foi menos eficaz que o milagre de Alonso. O espanhol, pelo menos, subiu na tabela.

Mas foi bom, ô se foi...

Friday, October 05, 2007

Espanha urgente!

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Fato da maior relevância vale post de emergência.

O devotado leitor Rafael Duarte, que mudou recentemente para a Espanha, trouxe nos comentários abaixo uma amostra do que está acontecendo entre a fanática torcida espanhola, por conta da não-punição a Lewis Hamilton.

É triste, sério e grave, pela quantidade de absurdos escritos nos fóruns a que ele teve acesso, e principalmente pelo teor ultra-racista de alguns deles.

Com a devida permissão do Rafael, reproduzo seu comentário:

Update de Espanha...

Os caras estao FULOS da vida por aqui dada a absolvicao de Hamilton. Os jornais e os comentarios em varios foruns de discussao tratam o Hamilton com uma hostilidade gigante. Dizem que ele é "protegido" da MA"FIA" (Otima esta), etc, etc, etc...

O "As" publicou que "En cuanto al líder del mundial, Lewis Hamilton, a la luz de las evidencias no se le impone ninguna sanción." O "Marca" segue a mesma linha editorial.

O que mais me impressiona sao os foruns de discussao no site do "Marca". Os ataques dos leitores eh, para usar eufemismos, bem feroz, chegando a ter comentarios maldosos e racistas a respeito do britanico. Nao sei como o "Marca" autoriza esses posts. Nao devem fiscalizar isso. Impossivel. Pra voce ter ideia Alessandra, la vao alguns:

- "BASTA YA!!! Que no corra nadie en China!! Que corra el puto negro solo!! LAMENTABLE FIA!!! ATRACADORES!!! BASTA YA!!"

- "ESTE TÍTULO ESTA COMPRADO A TODO UNA ORGANIZACIÓN CORRUPTA-LA COMPETICION EMPIEZA A DAR ASCO-QUE TERMINE CUANTO ANTES EL CIRCO. DISFRUTA NEGRITO EL REGALO QUE TE HAN HECHO."

- "LO ACABAN DE DECIR... hijos puta de la MA FIA..."

- "Pues eso, ahora mismo Jaimito y Ron están con los pantalones bajados y la boca llena haciendo favores sexuales a los de la FIA para que no los sancionen."

Ui... Deu pra sentir o clima?

To colocando como esta la... Creio que aqui só tem leitores adultos, e achei que colocando na integra os leitores aqui e voce, Alessandra, iam sentir melhor a opiniao da imprensa e da torcida espanhola... Qualquer coisa me desculpe...

Abraco!


Considerações:

1) O nível de indignação não é muito diferente do que nos acostumamos a ver nos fóruns daqui, nos tempos de Schumacher e do brasileirinho que lutava contra o mundo todo;

2) Não botei muita fé na punição a partir do vídeo. Equilibraria o campeonato? Sim. Mas a FIA ia dar um mole desse para uma imagem clandestina? Mais fácil vaca voar.

3) Está ficando evidente que Hamilton não é o queridinho só de Ron Dennis, mas nada, nenhuma eventual injustiça contra Fernando Alonso ou contra quem quer que seja justifica a conotação racista das colocações.

Thursday, October 04, 2007

Enquete: 2007 = 1994?

Lewis Hamilton pode ser campeão no próximo domingo. O atual campeonato foi o mais conturbado desde...













... a temporada de 1994, quando Michael Schumacher sagrou-se campeão, pela primeira vez, a bordo de um Benetton cercado de desconfianças, como aliás...











... ocorre com o McLaren Mercedes de Hamilton, neste ano.

Pergunta: se confirmado o título de Hamilton, ele carregará esta mesma falta de legitimidade que, na opinião de alguns, paira sobre o primeiro título de Schumacher?

Vamos, escrevam à vontade!