Tuesday, January 30, 2007

Feliz Aniversário (ou Distrações de uma blogueira)

Desculpem a omissão, o esquecimento, a terrível pisada na bola, mas no dia 29 de janeiro, este blog completou um ano e eu, a dona da pensão, simplesmente esqueci de fazer o registro.

Agradeço a todos pela companhia até aqui, convido a ficar por muito tempo ainda e sugiro a leitura do primeiro post deste blog, "A parábola do tremoço", no menu ao lado, em January 2006, para quem ainda não o fez.

Monday, January 29, 2007

Tim Randolph não gosta de GrandPrix

Já está no ar minha mais recente coluna no GPTotal, sobre um misterioso piloto que não gosta do maior filme de corrida de todos os tempo. Que será? Vai !

Saturday, January 27, 2007

Alguém anotou a placa?

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Não foi bem que Serena Williams venceu Maria Sharapova na final do Aberto da Austrália. O mais exato seria dizer que a norte-americana derrubou, atropelou e depois pisou em cima da russa. Uma hora e três minutos foram suficientes para Serena fazer dois sets a zero, com acachapantes parciais de 6-1 e 6-2. Serena, que entrou na competição como a número 81 do ranking, fez strogonoff da número 1. Sharapova está tão fime no topo da classificação feminina mundial que a derrota fragorosa não lhe fez nem cócegas. Segue em primeiro. Já Serena, que terminou 2006 em 95º lugar, vai aparecer na próxima lista em 14º.

Tenho grande simpatia por Serena, desde que ela venceu meu maior desafeto no tênis mundial de todos os tempos, a suíça Martina Hingis, na final do US Open de 1999. Serena tinha 18 anos na época e ainda era mais a irmã caçula de Venus Williams do que propriamente uma estrela. Naquela noite, em Flushing Meadows, ela fez com a desprezível Hingis mais ou menos o que aprontou com Sharapova neste final de semana. No entanto, a reação da russa à derrota, hoje em Melbourne, foi totalmente diferente do ataque de nervos da suíça, naquele já longínquo 1999. Enquanto a russa, neste sábado, posou feliz com a companheira vencedora e ao lado de seu troféu de vice-campeã, Martina ficou tão fula da vida naquela final do US Open que foi literalmente chorar no colo da mamãe depois de vencida.

Eu adoraria dizer que Serena está de volta à velha forma, mas não apostaria nem um dólar furado nisso. Apesar de ter acabado de conquistar seu terceiro título no Australian Open (os outros foram em 2003 e 2005), Serena parece viver uma espécie de esquizofrenia esportiva. Alterna exibições impecáveis, como a de hoje, com períodos de contusões sérias que a deixam fora de combate por vários meses. A fase atual revela um pouco dessa instabilidade. No ano passado, uma lesão no joelho impediu que ela realizasse a temporada completa no circuito profissional, disputando apenas quatro torneios. Está visivelmente acima do seu peso ideal. Serena surgiu para o mundo do tênis como uma atleta de músculos avantajados, sempre foi espantosamente forte, mas a forma atual está longe de ser uma celebração ao chamado "peso magro".

O mal que parece acometer Serena Williams é o mesmo que tem rondado diversas estrelas do tênis mundial, a começar pelo brasileiro Gustavo Kuerten. Ela, sua irmã Venus, Guga, Andy Roddick, Rafael Nadal, entre outros, têm enfrentado lesões recorrentes em articulações como joelhos, tornozelos, ombros e quadris. A força do tênis atual é muito grande. O impacto da bola, assustador. Para responder à altura, dá-lhe musculação. Excesso de carga mais impacto... Uma hora, a corda arrebenta mesmo.

Grandes jogadores jamais serão super-heróis, porque felizmente continuarão sendo humanos. Cedo ou tarde, o corpo grita.

Friday, January 26, 2007

Maceió, o que Deus deu, o que o homem não dá

Devo ser mesmo alguém bem chata. Não que eu deteste viajar, gosto. Mas logo sinto falta da minha cama, do meu travesseiro, dos meus hábitos bestas. Estar de frente para o mar é um processo que atravessa três fases. Nos primeiros momentos, o deslumbramento. “Ah, que natureza linda, que paisagem privilegiada!” No segundo, a descompressão. “Puxa, quase nem pensei em trabalho, faz tanto tempo que não ligo o computador...” No terceiro, ai, que saco!!! Quem colocou toda essa areia aqui?!?!

O surto contra a vida selvagem até que demorou, desta vez. Me agüentei firme por vários dias, sinceramente envolvida pela beleza natural de Maceió. (Também, quando o chilique veio, sobrou para todo mundo: para a indefectível areia, para as algas, para o anoitecer precoce e, Oscar de melhor atuação destas férias, para o vento, diacho de vento inesgotável dessa terra!). Outra coisa que vai me tirando do sério nas férias é a hipocrisia do biquíni. Um instante, maestro: alguém já parou para pensar na porção de falsidade contida naquelas duas peças? À análise, pois.

A maioria das mulheres que veste biquíni jamais andaria de calcinha e sutiã pela casa, fecharia as janelas, cortinas e frestas sob a perspectiva de ser observada pela vizinhança em trajes íntimos. E, no entanto, vestem biquínis que recobrem menos seus corpos que suas enormes calcinhas de cintura alta e dispositivo de compressão na barriga. O que cria o salvo conduto do biquíni? É o tecido que limpa a barra ou as mulheres se deixam inebriar pela mistura insana de areia, maresia e vento, andando pela faixa de areia de uma maneira que não fariam dentro da própria casa? Enfim, em frente...

Como isso não se trata de uma reportagem turística, vou ser curta e grossa em minha faceta guia de viagem. Maceió é uma capital de linda orla, com praias paradisíacas a relativamente pouca distância do centro. Andando trinta ou quarenta quilômetros, para o sul ou para o norte, chega-se a recantos belos, locais quase rústicos onde a natureza é, de fato, privilegiada.

A questão é que meu encantamento com a natureza tem vida curta. Devo ser como aquele cantor chatinho que diz se encantar mais com a rede que com o mar. Mea culpa, mea maxima culpa, mas sou encantada com realizações, com transformações, com a capacidade do homem de progredir. A natureza bela esteve aí desde que o mundo é mundo, ninguém precisou criar nada. Bonito, para mim, é ver o homem interagir de maneira inteligente com esse mundo de Deus e deixar sua marca, criar o belo, não apenas admirá-lo.

Ano passado, fui para Salvador pela primeira vez. Amei a cidade, me encantei com tantos monumentos e locais históricos, tive a sensação de sempre ter estado lá. Não é sensação de vidas passadas, não, é o aflorar de tantas informações que crescemos ouvindo, seja nas aulas de história, nos romances, nas poesias, nas letras de música. (Ainda que eu tenha levado um choque imenso ao ver a tal escadaria do Senhor do Bonfim. Escadaria, baiana, pára com isso! Aquilo são três degraus!!!) Salvador e Maceió, como de resto todo esse nosso miserável país, são cidades que escoam pobreza por todo lado, o que dá uma tristeza quase permanente estando lá (lá e aqui, né?!). A natureza, em Maceió, é mais selvagem, menos urbanizada que em Salvador. Para quem gosta de praia, Maceió. A cidade de Salvador, por sua vez, é história, é folclore, é poesia, é música, é arquitetura colonial, é opulência do ouro. Para quem gosta de cidade, Salvador.

A sensação que tive, ao percorrer as ruas e a estrada costeira da capital alagoana, foi de que a cidade tem só o que Deus deu. O homem ali, até agora, não foi capaz de fazer muito. A natureza farta chocou meus olhos. Em toda a orla, coqueiros, coqueiros, coqueiros. Cocos e mais cocos apodrecendo no pé. Ninguém plantou aquilo, ninguém também vai colher. Não achei ninguém que me dissesse, mas não duvido que a voz corrente seja algo como: “o coco daqui não presta, não”. E eu não entenderia tal assertiva como insolência pura. Pode ser o fruto de uma tradição que opõe a posse e o poder, de um lado, e a pobreza e a subserviência, de outro.

Do sul maravilha, a bordo de meu pacote turístico pago em prestações, saí de Maceió com uma sensação incômoda, e não era a areia, esse meu antigo desafeto. Era a tristeza de ver como segue pobre e ao deus dará esse nosso Brasil.

Friday, January 19, 2007

25 anos sem ela

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19 de janeiro é uma data que sempre me deixa triste. E quase sempre é um dia feio e cinzento. Estava exatamente assim há 25 anos. No fundo, acho que nunca vou digerir isso direito.

Tuesday, January 02, 2007

São Silvestre

Há sete anos, em uma festa familiar de Reveillon, um dos convivas exibia feliz sua medalha da Corrida de São Silvestre. Grávida de três meses e sem nenhum histórico atlético, externei meu objetivo de, um dia, correr essa prova. Meu irmão riu e desdenhou. Imagina, você correr a São Silvestre... Não me tomei de brios, nunca acreditei no desdém. Desde aquele 31 de dezembro de 1999, as palavras dele se mantiveram como um estímulo heterodoxo.

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A frase da camiseta

Poucos dias antes do Natal, meu filho me pregou um susto. Passou dois dias internado com algo que depois se confirmou como uma virose. Até fechado o diagnóstico, muito apreensão. Depois do susto, o alívio. Voltando para casa, na saída do hospital, decidi a frase da camiseta: “Gracias a la vida”. Uma inscrição que continha vários significados. Um óbvio: graças por sua recuperação e pela pouca gravidade da ocorrência. Era também uma forma de homenagear minha cantora preferida, Elis Regina, que gravou música com este título no disco “Falso brilhante”. Elis, cuja morte completa 25 anos em 19 de janeiro próximo. E o fato de ser uma canção forte, composta pela chilena Violeta Parra, um dos ícones da música latino-americana “engajada”, traduz minha perene esperança de ver nosso pobre continente unido e pujante. Meu hábito de correr sempre com o boné branco e azul do Racing Club, que era do meu pai, somado à frase em espanhol, levantou-me a hipótese de que me identificassem como argentina. Não foi para apagar essa impressão, que não me ofende em nada, que decidi a frase das costas da camiseta.



“Viva o povo brasileiro”, acompanhada de uma bandeira do Brasil estilizada, era a homenagem ao povo que, desde o começo, eu havia imaginado. Nasceu da inspiração sugerida pelos leitores e foi, ao longo do percurso, a frase que mais suscitou comentários dos espectadores, nas ruas. Recebi vivas e palmas por várias vezes e fiquei sinceramente orgulhosa da escolha. Na avenida Rio Branco, em especial, algo me chamou a atenção: entre os olhares à margem da pista, o “povo brasileiro” por mim homenageado tinha eventualmente as feições andinas típicas de bolivianos e peruanos. Gente que tem desembarcado em São Paulo, nos últimos tempos, em busca de trabalho quase sempre mal pago e sacrificado, fugindo de coisa pior em seus próprios países. E, de repente, as frases da frente e a das costas pareceram traduzir a mesma esperança de um povo latino-americano mais feliz.



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A corrida

Foi minha primeira São Silvestre e eu não sabia de fato o que esperar. Primeiro, achava que teria muita dificuldade na mítica subida da Brigadeiro. Depois, tranqüilizada por meu treinador em relação a esse item, voltei atenção para algo que ele considerava mais penoso – o percurso pelas ruas do Centro da cidade. Ruas estreitas, abafadas, com calor forte, um suplício. Atentei para o que os amigos veteranos Tales Torraga e Luiz Dias falaram, para poupar no início, guardar energias para o final. E nunca olhar para cima na Brigadeiro, para não desanimar. E também para a dose certa de hidratação: pegar um copinho de água em todos os postos, mas não beber em demasia. Molhar a boca, jogar água na nuca e nos pulsos, molhar o corpo se muito quente. Escolhi a bermuda que não tinha elástico frouxo nem que apertasse demais, certifiquei-me quanto aos cadarços bem atados, fui para a Paulista sem lenço e sem documento, para não me preocupar em segurar nada nem em deixar o que quer que fosse no guarda-volumes. 15h15, dada a largada.

Habituada a correr provas menos tradicionais, mas já atraentes para atletas amadores, me espantei com uma característica inesperada da São Silvestre. Não me deparei com aquele bolo de gente que costuma atrapalhar o ritmo de corrida nos primeiros quilômetros. A prova feminina da São Silvestre é consideravelmente menos cheia de atletas que, por exemplo, as provas da Corpore. Outro detalhe me chamou a atenção ainda na Paulista, repleta de espectadores nas laterais da avenida. Palmas, tantas e tão entusiasmadas, que cheguei a procurar no meu entorno para ver se havia “alguém conhecido”. Demorei a perceber que as palmas eram para nós mesmas, as tais “atletas amadoras que fazem a festa na Paulista, neste último dia do ano, mostrando sua disposição e blá-blá-blá”, na fala do locutor televisivo. Deve ser a mesma sensação de quem desfila pela primeira vez em uma escola de samba. O que essa gente está aplaudindo? Você, lesada!

Tudo bem na Paulista, tudo melhor da Consolação, desce o morro. Com a orientação de segurar o ritmo no começo, não desembestei na ladeira. Na boa, na manha, completei os dois primeiro quilômetros em dez minutos. Beleza. Uma média alta na comparação com os treinos, mas uma boa perspectiva. Desde o início, não me fixei em fazer necessariamente um bom tempo. Queria mesmo era terminar bem, e correndo o tempo todo, os 15 km.

Na avenida Ipiranga, o céu já estava negro. Sempre que corro naquele pedaço, como na prova do Centro Histórico, me vem à mente a óbvia “Sampa”, porque logo a seguir se entra na São João. Fiquei com a música de Caetano na cabeça por um bom tempo. Até então, era “Gracias a la vida” tocando na mente. “Gracias a la vida que me ha dado tanto/ Me ha dado la risa y me ha dado el llanto/ Así yo distingo dicha de quebranto/ los dos materiales que forman mi canto,/ y el canto de ustedes que es el mismo canto/ y el canto de todos, que es mi propio canto”.

Na São João, o primeiro posto de água. Peguei um copinho. Molha o bico, molha o corpo, joga o copinho de lado. E sobe a alça de acesso do Minhocão. Boa subida, a mais íngreme da prova, mas curtíssima. Em cima do elevado, as manifestações da rua partiam somente dos prédios residenciais. Prédios que já foram bacanas e hoje, bem decadentes, abrigam famílias numerosas e, em grande parte, bem animadas. Estímulos o tempo todo, e uma bandeira do Corinthians em uma das janelas. Ao aceno dos moradores, gritei “Viva o Timão!” e arranquei aplausos ainda mais entusiasmados. No fim do Minhocão, sem prédios ao redor, um silêncio solitário, quase triste. E as nuvens de um negrume renitente. O dia ficou noite. Quando virei no Largo Padre Péricles, ela chegou. Grossa e quente, uma chuva-benção. Veio em boa hora, mas logo lembrei de um detalhe que sempre me preocupa em pista molhada: as manchas de óleo que fazem escorregar. Atenção na passada, vamos em direção à Barra Funda.

Metade da prova, e a chuva só apertava. No avenida Norma Pieruccini Gianotti, uma tempestade. Os pingos grossos e quentes deram lugar a sopapos aquáticos que chegavam a doer nos braços e no peito. O tênis começou a pesar como seu eu carregasse duas caneleiras de dois quilos. E o vento era contra. Mas, como sou do contra também, segui. Os óculos de sol, que mantive apesar da ausência de tanta luz, começaram a embaçar. Aí veio a “minha” subida da Brigadeiro.

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O imponderável

No viaduto que liga as avenidas Rudge e Rio Branco, segurando os óculos, notei que algo entrou no meu olho direito. Pisquei freneticamente para ver se saía. Não saiu. Cocei o olho, nada. Subi e desci o elevado com o olho direito fechado. Incomodava, raspava e ardia. Completamente encharcada, puxei a camiseta e esfreguei o tecido no olho. Melhorou. Ainda incomodava, mas pelo menos já conseguia mantê-lo aberto. Um retão me aguardava e lá fui pela Rio Branco inteira, passando pela Praça Princesa Isabel, aquela que tem o Duque de Caxias.

No final da longa reta, uma lanchonete com a televisão em altíssimo volume registrava a premiação das vencedoras. Ouvi o Hino Nacional Brasileiro e comentei com as outras atletas ao lado: “Uma brasileira ganhou!”. Braços para o alto, vivas ao Brasil. Elas já estavam no pódio e eu ainda tinha três quilômetros pela frente. E a Brigadeiro.

Estranhamente, a diferença entre as profissionais e eu não me desestimulou. Pensei que estava no quinto final da prova e que ainda estava muito bem, sem dor, com coração e pulmão sobrando e então aumentei o ritmo. O trecho final, no Centro, não foi penoso como me sugeriu o técnico. Pudera, não tinha nada do abafamento esperado com tanta chuva, que ainda caía, impiedosa. Foi, na verdade, bem agradável passar em frente ao Teatro Municipal, percorrer o Viaduto do Chá e me deparar com o Hotel Othon, onde meus pais passaram sua noite de núpcias, lugar que sempre me enternece. Uma boa subidinha na Líbero Badaró, em direção ao Largo São Francisco, e uma descida providencial para encarar a tinhosa, a inominável, a danada. “Ai, meu Deus, chegamos na Brigadeiro...”. A colega ao lado, altona pra burro, soltou a frase com um fio de voz incompatível com seu talhe gigantesco. “Quem é a Brigadeiro perto de você, mulher, vambora!”, eu disse e fui.

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Megera domada

Tendo conferido a altimetria da prova, sabia que, naqueles dois quilômetros finais, subiríamos quase tudo o que tínhamos descido antes. Mas eu também tinha visto que o trecho inicial era plano. Com o gás à toda, dei um bom sprint nos primeiros quatrocentos metros, até notar a subida se acentuando. Daí pra frente, baixei a cabeça, cadenciei o passo e fui subindo. Dava duzentas passadas, cerca de duzentos e poucos metros, calculados nos treinos de esteira, e uma olhadinha para frente. A multidão era significativa no ladeirão, quase todos abrigados da chuva em bares e lanchonetes. Um sujeito gordalhão gritou: “Podem parar, vocês já perderam mesmo!”. Pra quê?! A mulherada se enfureceu. Algumas xingaram. Só respondi: “Já ganhamos, já ganhamos!” Palmas: êêêêê!!! O povo me adora!!!

Quando cruzei a Treze de Maio, a placa dos 14 km. Puta que pariu! (desculpe, escapou) Seriam trezentos metros no planalto na Paulista, o que significava que tínhamos só mais 700 metros de subida. Menos de duas voltas na pista de atletismo do clube. Menos de duas! Apertei o ritmo novamente e fui reconhecendo muito do meu “quintal”. Como meu escritório e academia ficam na região, correr ali era como estar em casa. Na véspera, fui à minha loja preferida de roupas, na esquina da Brigadeiro com a São Carlos do Pinhal e disse às meninas: “Amanhã, vou estar aqui de novo e, quando enxergar a fachada da loja, vou estar muito feliz”. Ao alcançar a tal esquina, eu já tinha “aplainado” a Brigadeiro. Ali, já não tinha subida. Mais uns quatrocentos metros e pronto.

Virar a esquina e avistar a Paulista, embaçada com tanta chuva, foi uma das visões mais reconfortantes que tive na vida. Era um chegar em casa depois de um dia exaustivo de trabalho. Era encontrar a cama pronta para o sono, era sopinha quente em noite de inverno, era chuveiro morno, abraço de alguém querido que estava distante, colo de mãe.

O relógio oficial marcava 1 hora e 24 minutos cravados. O meu cronômetro eu zerei com 1 hora, 22 minutos e 53 segundos. Bem acima da média de treinos, um pouco acima da média de 5 minutos por quilômetro, mas não me aborreci. A classificação final me deixou muito satisfeita. Terminei em 360º lugar na classificação geral, 61º na minha faixa etária. Nessas horas, é difícil escapar ao chavão karetê kid de que sua conquista vale o esforço, de que é preciso acreditar em si mesmo, de que a superação é uma mistura de disciplina e auto-confiança.

Feliz, muito feliz, realizei um objetivo antigo. O riso do meu irmão hoje tem forma. Virou uma medalha dourada com um atleta estilizado e grafismos vermelho e laranja. Tem nome também – 82ª São Silvestre.



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A bravura dos grandes navegantes

No dia seguinte à empreitada, enquanto escrevo este relato, lembrando de cada detalhe, nem tudo me parece real. Na tarde deste dia 1º de janeiro de 2007, passeamos de carro pela cidade e fiz questão de percorrer alguns trechos do percurso. Andar na Rio Branco de ponta a ponta me fez incrédula. Corri mesmo tudo isso?

Correr a São Silvestre pela primeira vez reeditou em mim uma sensação que só tinha tido uma vez, após o parto do meu filho. A percepção de ter vivido algo grandioso e único, com uma necessidade premente de registrar o maior número possível de impressões, com medo de perdê-las nos desvãos da memória, retendo-as como se para vivenciá-las novamente. Ou, como lembro de ter escrito ao meu médico nos dias seguintes ao parto, como se tivesse vivido o último dia de aulas do último ano do curso: aquela certeza de que podem vir ocasiões igualmente importantes e marcantes, mas que nenhuma será como aquela. De forma bastante pretensiosa, acho que era assim que os desbravadores se sentiam, quando se lançavam ao mar e chegavam a algum lugar nunca visitado antes. De maneira ainda mais cabotina, chego a pensar que meu assombro ainda é maior, posto que nem sempre os navegantes tinham consciência de suas próprias façanhas.

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Gracias a usted!

Um registro final, na forma de agradecimento ao meu treinador, Zé Eduardo Pompeo, da Equipe Conexão. As planilhas enviadas quinzenalmente pelo Zé me prepararam para a prova, mas um detalhe foi fundamental nesta etapa. Certa vez, durante um treino, ele mandou que eu parasse a esteira e me mostrou como eu pisava errado. Notou que eu, bem mais leve que ele, fazia mais barulho ao “aterrissar”. Ensinou o jeito certo de dar a passada. De um dia para o outro, nunca mais tive bolhas nos pés. Minhas dores “de dia seguinte” também diminuíram drasticamente e meu tempo melhorou. Obrigada também ao professor Alexandre Cepeda, da Musculação da Runner. Junto com o Zé, ele venceu minha resistência inicial. Os dois traçaram um plano pelo qual eu dedicava dois dias da semana apenas à musculação, sem corrida. Eu não me conformava com a idéia de sair “seca” da sala, sem o suor típico dos treinos aeróbicos. Pois eles me dobraram e eu logo notei a melhora nos resultados. Por fim, mas não menos importante, um agradecimento a três pessoas: meu amigo Tales, que na semana anterior da prova me estimulou muito via MSN Messenger, e meus queridos “meninos” lá de casa, pelo apoio incondicional.

E para o pessoal do blog, nada? Claro que também agradeço por todas as manifestações de apoio, sugestões de frase e desejos de boa sorte. E espero incentivar pelo menos mais alguém a entrar para o time dos corredores de rua desta cidade e de qualquer parte do planeta. Corre, gente, corre!