Monday, September 15, 2008
Não é, mas parece
Antes de qualquer coisa, quero pedir desculpas aos leitores deste blog pela negligência nos últimos tempos. O excesso de trabalho, basicamente, não permitiu que eu desse a atenção merecida nem à produção de novos posts, nem às respostas aos comentários. Vou tentar compensar nos próximos dias.
Começo fazendo algo que há muito eu não fazia - escrever sobre música.
A idéia é inaugurar uma nova seção - "Não é, mas parece" - comparando músicas de certos artistas que parecem feitas por outros. Vamos ver como rola, podendo estender o conceito também para outras formas de manifestação cultural - livros, por exemplo.
Inauguro a seção - já convidando os leitores a comentar e acrescentar à vontade - falando sobre... The Beatles!
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Antigamente - e quando digo antigamente estou me referindo a séculos atrás - era comum artistas consagrados assinarem obras de seus pupilos, como prova do bom trabalho feito pelos jovens aprendizes. Quem assistiu ao filme Camille Claudel há de se lembrar com que afinco a bela aluna perseguiu a honra de ter uma peça sua assinada pelo professor, Auguste Rodin. (É certo que ela também queria que ele "deixasse sua marca" em vários outros sentidos, e acabou ficando lelé por causa do gênio, mas isso é outra história.)
Nos tempos modernos, tal hábito não se mantém, mas há autores reconhecidos como geniais que talvez sentissem orgulho em assinar obras de artistas que os sucederam. Selecionei duas músicas, compostas por dois grupos diferente, e em épocas muito distintas, que revelam, na minha opinião, fortíssima influência dos Beatles. Lennon & McCartney, aliás, continuam se espalhando por obras diversas nos últimos quarenta anos. As duas selecionadas servem mais como pontapé inicial, e foram escolhidas justamente por virem de grupos tão diferentes entre si.
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Virgínia - Mutantes
Quase contemporânea dos Beatles (a música foi lançada em 1971, no ano seguinte ao fim do quarteto inglês), Virgínia tem tudo de Beatles - a melodia lembra, levemente, "Martha, my dear". A letra, inspirada na irmã de Rita Lee, a própria Virginia, tem a melancolia das "silly love songs" dos primeiros anos. E o arranjo, de Rogerio Duprat, incorpora os naipes de metal que os Beatles começaram a usar depois de Sgt. Pepper´s. Um detalhe curioso sobre o lançamento desta canção: a primeira gravação aconteceu em Paris, em 1970, para o disco "Technicolor", com letra em inglês. O disco não foi lançado na época, permanecendo inédito até o ano 2000. Na volta ao Brasil, os Mutantes capturaram algumas músicas gravadas em Paris e as lançaram no álbum "Jardim Elétrico" (a própria Technicolor, El justiciero e também Virginia, gravada dessa vez em português). Na letra em português, há a seguinte menção: "eu me lembro de janeiro, quando o sol me deu você". Vertendo-a para o inglês, Arnaldo, Sergio e Rita tiveram o cuidado de adaptar o conteúdo à estação do ano, e o verso ficou assim: "I remember January, when the sky was gray and cloudy" (ou seja, "eu me lembro de janeiro, quando o céu estava cinzento e nublado"). Como descendente de norte-americanos e fluente em inglês desde a infância, desconfio que a sacada da letra em inglês foi toda da dona Rita. Entre 2006 e 2007, quando voltaram a se apresentar juntos, sem Rita, os Mutantes sempre incluíam Virginia em seus shows, cantando-a de um jeito bem simpático, na maioria das vezes - mesclando a letra em inglês com a letra em português.
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Stuck in a moment you can´t get out of - U2
A banda irlandesa U2 nem está entre as mais comparadas aos Beatles. Nos tempos mais recentes, o cetro sem dúvida iria para o Oasis, nem tanto pelo que se assemelham aos Fab4, mas pelo que querem parecer (ui, que maldade!). O U2 tem personalidade própria e, ao longo dos últimos 25 anos, sempre soube se reinventar, inclusive arriscando em sonoridades por vezes estranhas - como fizerm em "Achtung Baby", disco de 1991 cheio de dissonâncias. Em 2000, lançaram o álbum "All that you can´t leave behind", com megasucessos como "Beautiful Day" e "Walk on", além dessa "Stuck in a moment you can´t get out of" que, na minha opinião, não faria feio se estivesse, por exemplo, entre as canções de "Let it be", dos Beatles. Bono talvez nem tenha tido a intenção, mas quando pronuncia frases como "I never thought you were a fool, but darling, look at you", praticamente revive John Lennon e seus conselhos edificantes.
Agora, é com vocês. Que músicas de outros artistas poderiam ser "assinadas" pelos Beatles?
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12 comments:
A obra toda dos Zombies vale?
Brincadeiras à parte, nos meados dos anos 90 a dupla Tears for Fears lançou o que seria seu disco de maior impacto comercial e provavelmente criativo. A obra chamava-se "Seeds of Love" e tinha a capa muito psicodélica com uma foto dos dois com guarda-chuvas prateados, o sol e a lua, uns peixes voando... louco...
O lado A (sou velho, não?) começava com uma balada que lembrava os melhores momentos de McCartney e seguia com "The badman's song" longuissima e com ecos de John Lennon.
Mas é na faixa titulo que a gente se confunde de vez. A musica bem que poderia fazer parte de Sgt Peepers tamanha a semelhança com a obra dos Fab Four.
Tanto que levou Paul a fazer um comentário em tom irônico e num contexto até magoado: "-Simplesmente nos copíaram, um quer ser John e outro quer ser Paul..."
Tema apaixonante este.
Ah! E as obras dos Monkeys e dos Birds? Posso citar também? heheheh
A lista dos artistas que se inspiraram ou simplesmente copiaram os Beatles é interminável. Teve até coisas bizarras como o Klaatu, uma banda dos anos 70 cuja publicidade era baseada no "mistério" de eles poderem ser os Beatles disfarçados. Nos meus "Beatles" prediletos estão os Rutles, uma paródia feita nos anos 70 pelo Eric Idle (do Monty Python) e Neil Innes (www.rutles.org) e o XTC, uma banda inglesa pós-punk que, assim como os Beatles, renunciou aos shows ao vivo e virou banda de estúdio até acabar há poucos anos (o site é http://www.xtcidearecords.co.uk).
Alê...
Mas é claro que é minha cara, eheheh...
e de cara, então, é muito bom estar num blog onde comentam XTC, que são fantásticos, mesmo emulando os fab, mas de forma muito criativa, e lembrar do Klaatu, que teve uma música chamada "Calling occupants of interplanetary craft" gravada pelos...tchan tchan tchan tchan... Carpenters...
Minha pitada: dos próprios Mutas, a música "Vida de Cachorro" tem sua estrutura baseada nos contrapontos de Blackbird dos McFab..
Mas vou cutucar os Fab: nos primeiros discos eles gravaram vários covers, e uma das marcas registradas do Macca era "Long Tall Sally"...como todo bom artista que começa a gravar, logo entenderam que gravar música dos outros não dá direitos autorais a quem gravou mas a quem compos, por isso lascaram "I'm down", que é uma mamada firme no Little Richard, autor da Sally...
e que vá em paz Richard Wright, tecladista do Floyd, que tanto nos fez viajar em suas camas maravilhosas...
E que o Macca em Israel não vire tragédia...
good to have you back, dear...
BADFINGER merece destaque no tema (a ponto de gravar pela Apple).
ron: bingo! juro que a tentação de colocar "tears for fears" foi grande, mas tinha certeza de que alguém o faria. e logo no primeiro comentário. "seeds of love" é realmente um excelente exemplo, porque, na minha opinião, traduz o bom uso da influência. não é cópia, é assimilação. como diz meu amigo gê tock, músico dos bons, citando um professor seu: "se você fizer esse acorde como o toninho horta, não serve. para ouvir o toninho horta, ouço o toninho horta, não ouço você."
smirkoff: caramba! eu não conhecia essas bandas, obrigada por trazê-las para o blog. a página do rutles é engraçadíssima, com as letras/paródias e o símbolo da gravadora - uma banana no lugar da maçã! adorei!
henrique: que bom tê-lo aqui novamente! pois é, os mutantes não tiveram vergonha em usar a influência dos beatles, em vários aspectos. pelo que já li a respeito, a semente foi plantada pela rita, que era fã de primeira hora dos rapazes de liverpool, e adubada pelo rogério duprat, que alucinou com sgt. pepper´s. o que eu gosto dessa influência também é a questão da assimilação. sem dúvida, é uma influência forte, mas não é cópia. "vida de cachorro" talvez seja até mais parecida com "blackbird" do que "virgínia" com "martha, my dear", mas tem ecos de beatles em muitas outras criações dos mutantes. até em músicas que não guardam grande semelhança entre si. tenho ensaiado um post - quero ver se faço logo - traçando um paralelo entre "she´s leaving home" e "fuga nº 2". e mesmo nas músicas de festivais - como "caminhante noturno" - aqueles naipes de cordas têm muito a ver com os arranjos a partir de sgt. pepper´s.
legal você ter apontado a faceta "cover" dos beatles, no início da carreira. nessa seara do rock, se a gente for retrocedendo até a origem, talvez original mesmo tenham sido só little richard e chuck berry. se bem que, como sempre digo, todo mundo sempre se inspirou em alguém - dos gregos para cá, é tudo cópia!
neder: fui atrás do badfinger e achei vários vídeos no youtube. um dos guitarristas, inclusive, é a cara do paul!
"El Jardin donde vuelan los mares", do Fito Paez. É do Circo Beat, um disco que tem ar meio pretensioso de ser um Sgt. Peppers. É bom prá cacete, mas nao chega a tanto. E se a música citada tivesse no "Magical Mistery Tour", o pessoal só ia estranhar porque ser ela cantada em castellano.
ico: não conheço essa música. se tiver aí em mp3, agradeço :))
Lembrei...
No album "What's the story morning glory' do Oasis, absolutamente tudo lembra Beatles. desde a capa até o som...
As mais 'fab four' são as que acabaram tocando mais no rádio:
"Wonderwall", "Don´t loock back in anger" que inclusive tem os acordes iniciais de "Imagine" E a fabulosa "Champagne Supernova" que um crítico maluco lá dos EUA disse ser "A day in the life" dos anos 90.
Mas quando a gente ouve uma canção chamada "She´s Eletric" temos a impressão de estar ouvindo os Beatles reunidos.
Mas Oasis deveria ser café com leite já que Lian e Noel já disseram que eles são Paul e John.
Arrogancia alí abunda... E o talento também.
"Dois Rios" do Skank bebe diretamente dos discos mais conceituais dos Beatles, sua atmosfera etérea e sua harmônica nos remetem imediatamente a algumas das composições mais "cabeça" deles.
Oi, Alessandra, tudo bem?
Alessandra, sabe aquela onda que passou pelas gravadoras há algum tempo, de lançar álbuns com um determinado artista convidando uma penca de outros artistas pra gravarem juntos? Acho que isto começou com o Frank Sinatra, lembra-se? Chegou até aqui no Brasil, diversos artistas brasileiros fizeram o mesmo.
Então, fico imaginando se na época alguém tivesse tido esta idéia e tivesse saído um "Beatles Convida", ou coisa do gênero. Beatles com o The Who, Beatles com os Stones. Com mais tantas figuras não só do rock.
Pra comprometer irremediavelmente meu comentário, mas viajar sempre é bom, já imaginou um "Beatles are Brega Too"? Um LP - tem que ser vinil - onde teríamos os quatro de Liverpool recebendo Nelson Ned numa versão psicodélica de "(...) mas tudo passa, tudo passará (...)". Sidney Magal, o quinto beatle, emplacaria duas no álbum, o "Sandra Rosa Madalena" e "Meu Sangue Ferve Por Você". Aquele sujeito que cantava "Fuscão Preto" tinha que fazer parte do emprendimento também. Seria legal, no mínimo, ouvir Paul e John cantando "Oh Black Fusca! You are made of steel... My head ficou a mil..." e assim por diante.
Ah, lembra-se do verso mais contundente do cancioneiro popular brasileiro? "Se você pensa que meu coração é de papel. não vá pensando pois não é!". Olha, se traduzir pro inglês fica tão bom quanto ou talvez melhor: "If you think that my heart is a piece of paper, don't think that because it's not!". Isto com um arranjo do Paul ficaria que seria uma maravilha.
Desculpaí, Alexandra, comprometo-me a voltar mais sóbrio, desculpaí colegas comentaristas.
(mas que seria legal, seria)
Perche non:)
BADFINGER merece destaque no tema (a ponto de gravar pela Apple).
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