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Ontem, depois de 34 anos, a Portuguesa ganhou um título. A Portuguesa, a Lusa, o time do meu pai.
Meu avô José, que nascera em Portugal em 1893, chegou ao Brasil rapazola. Por afinidade, simpatizava com a Portuguesa, como era natural, ó pá. Mas, e isso eu só soube adulta, muitos anos após sua morte, acabou arrastando a asa para um certo time identificado com as camadas populares. A verdade é que meu avô português era corintiano. Casou-se coroa, teve a primeira filha depois dos quarenta. Só voltou a ouvir chorinho de bebê em casa, novamente, nove anos depois. Meu pai nasceu quando meu avô, pois, já tinha 51 anos e um longo histórico de corintianismo.
Mas o moleque não quis nem saber do alvi-negro. O pai o levava para brincar nos charcos do Ibirapuera, antes de ali haver um parque, e naquele campo sem dono treinava o time da Portuguesa de Desportos. O menino se apaixonou pelo time, talvez pela identificação com a origem lusitana dos pais. Ficou fanático a ponto de cair doente quando a Portuguesa vendeu um certo Pinga para o Vasco da Gama. Meu avô, percebendo o paradoxo, virou casaca. Não tinha lógica: ele, português, torcer pelo Corinthians, enquanto o filho, brasileiro, sofria pela Lusa.
Em sua meteórica passagem pelo planeta, meu pai só comemorou um título da Portuguesa, o Paulistão de 1973, numa confusão dos diabos provocada pelo árbitro Armando Marques. O campeonato daquele ano acabou dividido entre a Lusa e o Santos e parece uma sina isso - sempre que a Portuguesa for campeã, no mesmo dia o Santos levantará a taça. Mas, afinal, não é do Santos que isto se trata.
O mais próximo que chegamos de comemorar um título da Lusa foi no Brasileiro de 1996. "Chegamos" sim, pois me engajei na torcida quase como se fosse pelo meu Timão. Lembro nitidamente do primeiro jogo da final, contra o Grêmio, disputado aqui em São Paulo. Peguei um congestionamento dos diabos, uma enchente ou coisa assim e cheguei em casa esbaforida, com o jogo já em andamento. Encontrei meu pai lavando a louça do jantar, com TV e rádios desligados. Cheguei a protestar, como se eu não conhecesse sua lógica irrefutável. Nunca assistia aos jogos, como garantia de satisfação posterior. "Se ganhar, fico feliz. Se perder, fico feliz de não ter perdido meu tempo." Naquele dia, no entanto, ele mal disfarçou. Estava era nervoso com a disputa do título. Não deu, apesar da vitória no jogo de ida.
Nunca mais chegamos perto de disputar título nenhum. Ele pelo menos não viu a Lusa desabar para a Segunda Divisão no Brasileiro e no Paulista. Até ontem, minha alegria mais recente com a Portuguesa foi o fato de ela não cair para a Terceira Divisão, no final do ano passado. Mas, como já disse a vários amigos palmeirenses na época da queda, o bom de cair é a perspectiva de subir, de preferência colocando mais um troféu na galeria das conquistas. Foi o que fez a Lusa, para minha alegria, do meu pai e do ícone Flavio Gomes. É para os dois que dedico este post de hoje.
E, para quem não leu, sugiro este texto, o primeiro do blog, uma singela homenagem à Lusa dos meus antepassados.
Viva a Lusa!
Monday, May 07, 2007
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6 comments:
Alessandra, sempre leio seu blog, mas nunca escrevo nada. Sou torcedor da Portuguesa e hoje o Flávio Gomes escreveu um texto no blog dele cheio de referências às canções que foram senha para a revolução dos Cravos, você leu?
li sim e até comentei. parabéns, para você também, querido anônimo! quem não leu, vale a pena, gostando ou não de futebol. o link para o blog do Gomes está aqui ao lado.
Alê,assisti o jogo ontem e vibrei nos gols como há muito tempo não fazia ( o Corinthians não deixa). Adorei ver a Lusa ganhar. E me lembrei do seu pai, é claro, uma das pessoas mais maravilhosas que eu conheci nesta vida. Viva a Lusa!
Muito gostoso este teu post. Também me lembro desta inesquecível final do Brasileirão, mas eu tava torcendo logicamente pelo time gaúcho. a Lusa estava en tre altos e baixos e na última rodada, graças ao palmeiras e ao Bragantino(que tirou nosso eterno rival, o Inter) eles passaram pelo Cruzeiro e pelo Atlético MG. Na final, um jogo pá de emocionante. No primeiro jogo, a Lusa jogou melhor. no segundo, aquele chute milagorso do Ailton(muito criticado na época)deu o bi ao tricolor 15 anos depois. E o pior que eu já tava aceitando o fato de ver a Lusa dar volta olímpica no olimpico. Me lembro muito bem como setores da imprensa do centro do país tentava induzir aos brasileiros a torcerem pelo time paulista. Um exemplo irritante foi quando o Faustão alegava que a Lusa nunca tinha ganhado título e que o Gremio já tava acostumado a títulos. E pior que era durante todo o programa até as 7 da noite ele falando aquilo. Nunca vi ele dizer, por exemplo, que o Azulão ganhasse o Paulistão pelo mesmo motivo.
Eu tava zapeando na parabólica e vi um erro na REde Vida. Quando eles tavam mostrando todos os campeões estaduais, eles terminaram curiosamente com a Portuguesa campeã da A-2. O erro não foi este, mas sim o hino. Eles colocaram o antigo hino e não o de 83 do Roberto Leal. Ou será que voltou o hino antigo e não sabia?
Abraços Alessandra Portuguesa
Algo me diz que a Portuguesa é um segundo time de muitos Paulistas e principalmente Paulistanos, algo como os Américas do Rio e Minas. Engraçado como times assim tem essa simpatia!
cy: eu não vi o jogo, que pena! acho que todo mundo que conheceu meu pai e vê a lusa acaba torcendo por ela por simpatia a ele, né? se bem que você tem uma longuíssima tradição lusitana na família, né?
celinho: putz, aquele título perdido foi um dos mais sofridos para mim, te juro, mesmo não sendo do corinthians. engraçado que, mesmo com dois a zero no primeiro jogo, eu nunca tive muita confiança no título. achei que o tricolor dos pampas podia reverter, como reverteu. aliás, foi a mesmíssima matemática da final entre santos e são caetano, né?
quanto à torcida da mídia pela lusa, acho que você tem razão mesmo e acho que seria bem diferente se o "grande" em questão fosse um time do rio ou de são paulo. duvido que a tv fosse contra flamengo ou corinthians, por exemplo.
sobre o hino, eu acho que esse hino que você ouviu ("portuguesa de desportos, orgulho do esporte nacional") é de fato o hino oficial da lusa. só que ele é tão ruinzinho que o hino do roberto leal ganhou a torcida, de longe.
atch: sua impressão é totalmente correta e isso, de certa forma, é o grande mal da portuguesa. ser o segundo time de quase todo mundo pode ser uma baita prova de simpatia, mas também é uma evidência de que ela não é o primeiro! e a torcida da lusa continua pequeníssima, não graças a devotados como o flavio gomes, que criou dois filhos torcedores da lusa, praticamente um recorde!
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