Monday, December 15, 2008

Um conto são-paulino

Adoro histórias de arquibancada, contadas por testemunhas do lado de lá do alambrado. Quem acompanha esportes há muito tempo, como é o meu caso, coleciona muito da dita história oficial dos eventos esportivos. Mas, pela visão do torcedor, às vezes surgem relatos ótimos, revelando lados diferentes de um mesmo fato. Este me foi contado pelo amigo Ammar Hussein, membro da Equipe Conexão.

Novembro de 1993, São Paulo 3 x Guarani 2, Estádio do Morumbi

O São Paulo fazia seu último jogo pelo Campeonato Brasileiro antes de viajar para Tóquio, de onde voltaria com o bi do Torneio Mundial Interclubes. Eram os tempos de Telê Santana no comando daquele esquadrão que tinha Zetti no gol, Cafu na lateral direita, Toninho Cerezo e Leonardo no meio de campo, Muller e Palhinha no ataque. O Guarani tinha o goleiro Neneca - informação importante para o clímax desta história.



Ammar foi ao estádio com seu tio e se sentou ao lado de um fulano que passou o jogo inteiro xingando o lateral Cafu. Bastava o jogador pegar na bola que o torcedor tricolor gritava os maiores impropérios. "Você é muito ruim, Cafu", "Telê, tira o Cafu" e outros gracejos do tipo.

Até que, em um inspiradíssimo momento, Cafu recebeu um passe ideal, avançou pela grande área, aplicou um chapéu em um dos zagueiros do Guarani, chapelou mais um adversário e perpetrou o gol mais bonito do jogo. O estádio, naturalmente, explodiu em comemoração. Ammar não se esqueceu de deter o olhos no colega que passara o jogo inteiro xingando Cafu. O fulano estava meio atônito, dividido entre o impulso de comemorar e a vergonha.

Passado o momento de explosão da torcida, o estádio voltou àquele silêncio típico de bola rolando. Nesse momento, o desafeto de Cafu novamente se levantou e gritou, plenos pulmões: "Pô, Neneca, mas você é muito frangueiro, hein?! Leva gol até do Cafu!"

6 comments:

Ron Groo said...

Hahahah, que divertido!
Acho que este senhor que tanto criticava o Cafu já naquela epoca deve ter tido orgasmos triplos na copa de 2006 vendo como o Cafu se comportava em campo, finalmente lhe dando razão.
Uma vez eu estava no templo sagrado de Vila Belmiro, circa 1990, assistindo um jogo entre Santos e um time que jogava de amarelo e preto. Novo Horizontino acho. E o Santos jogava muito mal. Ao meu lado tinha um senhor que não tinha expressão facial alguma duramte todo o jogo. Com um braço sobre a barriga - enorme - e o outro apoiando um radinho de pilha no ouvido direito.
Então aos 43 minutos do segundo tempo saiu um gol do time de amarelo e preto e este senhor não moveu um só musculo além do braço direito, o que segurava o tal radinho. Atirando-o quase no meio do gramado. Então olhou pra mim e disse: Pra quem viu Pelé, Pita ver este time é um esculacho! E saiu antes do juiz apitar o fim do jogo.

Alessandra Alves said...

ron: esse tipo de história reforça uma tese que tenho sobre certo tipo de torcedor. para ele, não importa tanto se o time dele ganhe ou perca, porque ele não torce necessariamente pelo time ou por algum jogador, mas pela confirmação de sua própria tese. é aquele "técnico amador" que adora cornetar. se, para ele, o cafu é mau jogador, seu momento de glória acontecerá sempre que o técnico de verdade substituir o cafu. e, mesmo que tal substituição seja por contusão ou para rearmar o time depois de uma expulsão, por exemplo, ainda assim o "técnico amador" vai sentir sua tese comprovada. "tá vendo, não disse que ele era ruim?"

Anonymous said...

Cafu corria pacas e sempre se esforçava, mas nunca acertava um cruzamento. Até parecia brincadeira. Jorginho foi beeemmm melhor que ele.

Anonymous said...

Oi Alê....e não é que você reproduziu a história mesmo? Pois é, quem adora uma arquibancada, tem bastante história para contar. As figuras nas arquibancadas às vezes chamam mais atenção do que o jogo. Bjs. Ammar

Ico (Luis Fernando Ramos) said...

Pôxa, mas o Neneca era um bom goleiro!

Muito legal a história, Ale. Um dia te conto com calma como foi ver a final do Brasileiro de 86, também um SP e Guarani, no Brinco de Ouro da Princesa. Com as torcidas misturadas. Outros tempos...

Bjo

Daniel Reiner said...

Inevitável! Dei uma deliciosa gargalhada com o desfecho da estória. Tive uma experiência parecida com um amigo em um jogo do Cruzeiro, no Mineirão, pela Libertadores de 2004. Meu amigo xingava o Felipe Melo initerruptamente. O jogo dificil, empatado em 1x1...quando de repente: gol do Cruzeiro. Meu amigo emocionado, abraçava quem estava por perto quando eu o avisei que o autor do gol fora o Felipe Melo. Ele parou de comemorar, cruzou os braços e disse prá mim: Ah, se é do Felipe Melo eu não comemoro,não!

Inspirado na sua iniciativa, em breve contarei essa estória, com mais detalhes, no meu blog.

FORTE ABRAÇO!